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Se o Sineiro diz três vezes, é verdade
Lewis Carroll, o autor de
"Alice no País das Maravilhas", escreveu outra obra-prima, infelizmente menos conhecida no Brasil. É o poema
"Caça ao Snark", destinado a
crianças, como "Alice", mas
com muitos ensinamentos a
adultos dispostos a pensar.
Um grupo de caçadores sob
o comando do errático Sineiro
atravessa o oceano em busca
do misterioso Snark, que pode
ser -e no final se revela ser-
de fato o Boojum. O poema parece absurdo, mas é cheio de
significados.
O Sineiro impõe aos caçadores algumas leis. Uma é a seguinte: "O que eu disser três
vezes é verdade". Simples e arbitrário assim: qualquer afirmação repetida três vezes pelo
Sineiro é verdadeira.
Veículos de comunicação
que se julgam pregoeiros de alguma missão -política, religiosa, cultural- tendem a se
comportar como o Sineiro:
proferem convicções e julgam
que, pela repetição contínua,
elas se tornam verdades.
Jornais, programas de rádio
e TV, revistas, blogs, filmes,
anúncios seguem essa receita.
Às vezes com relativo sucesso,
se a medida do êxito for o número de pessoas que acreditam nessas verdades.
Veja-se islamismo de Barack Obama. Pesquisa do Pew
Research Center de setembro
revela que 13% dos eleitores
americanos crêem que o candidato do Partido Democrata é
muçulmano.
Mensagens pela internet,
blogs e outros meios controlados por ultraconservadores
têm disseminado a alegação,
sem base na realidade objetiva. E milhões de pessoas acreditam nela.
Como milhões acreditam na
teoria de hiper-esquerdistas
de que foi Bush quem ordenou
os ataques de 11 de Setembro.
No bom jornalismo, não há
lugar para o Sineiro. O jornalismo registra fatos, não firma
dogmas; inspira a dúvida, não
repete slogans; promove o debate, não proclama certezas.
Afinal, o Snark pode ser o Boojum. E quem o descobre pode
desaparecer.
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Carlos Eduardo Lins da Silva é o ombudsman da Folha desde 22 de abril de 2008. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Não pode ser demitido durante o exercício da função e tem estabilidade por seis meses após deixá-la. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores, recebendo e verificando suas reclamações, e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
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