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SUZANA SINGER
ombudsman@uol.com.br
Em algum lugar
do passado
"Injustiças" eternizadas em arquivos digitais de jornais são principal dilema ético em encontro anual de ombudsmans
NA MILENAR Oxford (Inglaterra), 31 ombudsmans de
16 países discutiram até ontem os rumos da imprensa na era
digital. Em um salão de 1618, igualzinho ao refeitório de Hogwarts,
onde Harry Potter graduou-se em
bruxaria, os "representantes dos
leitores" brindaram pela sobrevivência de um jornalismo independente, preciso e que preste contas
ao público.
Como o Lord Voldemort, que a
cada livro de Potter parece mais assustador, os problemas que os ombudsmans enfrentam, graças aos
avanços tecnológicos, vêm se tornando mais complexos.
O dilema ético que mais provocou debate no encontro anual da
Organização de Ombudsmans de
Imprensa (ONO) foi o de como lidar com "injustiças" eternizadas
em arquivos digitais. Nenhum dos
jornais representados em Oxford
tem, em seus códigos de conduta,
regras de como responder àqueles
que exigem que seus nomes sejam
retirados da internet.
Um garoto de 12 anos escreveu a
um jornal inglês, há poucas semanas, pedindo que seja apagada reportagem que o citava como vítima
de bullying -tipo de humilhação
entre crianças em escolas. O depoimento, dado seis anos atrás, era da
própria mãe do menino, que procurou o jornal na esperança de que as
ofensas cessassem.
Graças ao Google, os colegas do
garoto, agora em outro colégio, descobriram a história e começaram a
atormentá-lo. O pesadelo se repetia. O que fazer? Não há nada de errado com a reportagem, mas, como
lembrou um ombudsman, foi uma
decisão da mãe dar publicidade ao
caso, e jornalistas não costumam
ouvir o que a criança tem a dizer.
Na Bélgica, um rapaz cúmplice de
assassinato cumpriu sua pena, foi
solto, mas não consegue emprego
nem namorada porque seu nome
aparece ligado ao crime sempre que
alguém pesquisa na internet.
A terapeuta designada pelo Estado para acompanhar o rapaz pediu
ao único jornal que publicou seu
nome que deletasse a notícia, porque estaria inviabilizando a sua ressocialização. O diário trocou o nome dele por iniciais. Mas é correto
reescrever o passado de alguém?
Arquivo X
A Folha não mexe nos arquivos
digitais, porque os considera cópias do que foi impresso. Se houve
um erro no passado, mantém a notícia original, mas coloca uma nota
remetendo para uma correção.
Muitas vezes, o que falta é acompanhar um caso. Se foi noticiado
que o sr. X foi acusado de corrupção, e depois ele é considerado inocente pela Justiça, o jornal coloca
uma nota na notícia original remetendo para a decisão judicial a favor do sr. X.
Na era da internet, é preciso cuidado redobrado com o que se diz
na mídia. Quando uma jovem fala
hoje sobre como perdeu a virgindade, precisa considerar que, daqui a
20 anos, seu nome estará associado
a sexo sempre que alguém "der um
google" sobre ela. São "vidas marcadas para sempre", como definiu
meu antecessor, Carlos Eduardo
Lins da Silva, em 2008.
Não é agradável para o ombudsman dizer "sinto muito", "a vida é
assim mesmo" para um menino
acossado por colegas, um ex-condenado tentando refazer a vida ou
uma pessoa arrependida de suas
declarações juvenis. Em apenas
três semanas no cargo, tive que recusar, em nome da Folha, dois pedidos de mudanças de arquivos
-não descrevi os casos, porque,
mesmo com o anonimato garantido, os requerentes não permitiram
que suas histórias fossem citadas.
Seria perfeito vestir uma capa da
invisibilidade como a de Harry
Potter e fugir ao debate, mas não
dá. Considero a posição da Folha
consistente. Se o jornal ceder em
um caso, por mais justo que pareça,
haverá outro e mais outro, sempre
com bons argumentos. Estaremos
reescrevendo a história, o que é um
grande risco para todos.
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Suzana Singer é a ombudsman da Folha desde 24 de abril de 2010. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Não pode ser demitido durante o exercício da função e tem estabilidade por seis meses após deixá-la. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores, recebendo e verificando suas reclamações, e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
Cartas: al. Barão de Limeira 425, 8º andar, São Paulo, SP CEP 01202-900, a/c Carlos Eduardo Lins da Silva/ombudsman,
ou pelo fax (011) 3224-3895.
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ligue 0800 0159000; se deixar recado na secretária eletrônica, informe telefone de contato no horário de atendimento, entre 14h e 18h, de segunda a sexta-feira. |
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