São Paulo, domingo, 21 de junho de 2009

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Na educação, é essencial ir fundo

O simples aumento do espaço para a educação é pouco; o importante mesmo é a qualidade da cobertura

EM 42 DIAS , entre 4 de maio e a segunda passada, a Folha deu quatro manchetes principais para assuntos referentes a educação. Não é comum nos jornais brasileiros, este inclusive, dar tanto destaque a temas que não sejam de economia, política ou internacional. Em minha avaliação e na de muitos leitores, esta prática de relegar questões sociais a segundo plano é um dos piores vícios do jornalismo.
Nos 14 meses em que exerço este cargo, manifestei diversas vezes o desejo do público de que a educação volte a ter na Folha a prioridade de que desfrutava nas décadas de 1970 e 1980 e que perdeu.
Parece que a Redação está atendendo a esses apelos. Em 2008, até o dia 17 de junho, 72 matérias sobre educação haviam aparecido na primeira página; no mesmo período em 2009, foram 90. Muitas trataram de problemas da rede pública estadual, como livros didáticos com erros ou conteúdo inadequado para a faixa etária dos alunos que os receberam e o excesso de professores temporários.
Outras de projetos ou realidades nacionais, como os exames do Enem, o bom resultado acadêmico dos bolsistas do ProUni, o censo educacional e o alto índice de desistência dos alunos de supletivos. Perguntei à Redação se houve ordem para privilegiar a educação. A resposta foi: esta é uma prioridade editorial deste ano por ser "assunto que conjuga óbvia importância nacional e de interesse imediato do leitor" e porque em pesquisas "costuma aparecer entre os primeiros itens apontados por assinantes".
É ótimo que o jornal aquiesça à vontade expressa de sua audiência. Nem sempre isso ocorre. Mas o simples aumento do espaço e destaque para a educação é pouco. A Redação me informa que "está em discussão" criar uma seção ou página de educação, como fez no ano passado para saúde. Outra boa possibilidade, mas ainda insuficiente.
A página de saúde foi muito bem-vinda, mas com frequência trata mais da "saúde privada" (que não raramente resvala para o supérfluo) do que de políticas públicas, que interessam muito mais à sociedade. Espero que uma editoria de educação não incorra nesse modelo. Mas importante mesmo é a qualidade da cobertura. Há duas semanas a USP está engolfada em grave crise, e o trabalho deste jornal ao cuidar dela tem sido muito frágil, em minha avaliação.
Embora duas das reivindicações dos grevistas (aumento salarial dos funcionários e não implantação de cursos de graduação a distância) tenham finalmente sido objeto de reportagem nesta semana, o resultado foi superficial nos dois casos. Como fez em 2008 na greve dos professores paulistas, o jornal não vai fundo nos problemas que motivam esta na USP. E ir fundo é essencial quando o assunto é educação.


PARA LER

"Mídia e Educação", de Roseli Araújo Batista, Thesaurus, 2007 (R$ 25)

PARA VER

"Entre os Muros da Escola", de Laurent Cantet, de 2008, em exibição em São Paulo




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