São Paulo, Domingo, 21 de Novembro de 1999
Índice

O jornal na tela

RENATA LO PRETE


Há muito tempo a Internet é, de longe, o meio mais utilizado para fazer contato com a ombudsman, que hoje se corresponde com o leitor mais do que fala com ele.
Só recentemente, no entanto, começou a crescer em ritmo significativo o número de mensagens que não tratam da Folha impressa, mas sim da que se lê na tela do computador.
O protesto mais antigo e recorrente diz respeito à limitação de acesso ao site (www.folha.com.br). Ele só pode ser navegado por assinantes do Universo Online, do mesmo grupo que edita o jornal, ou da própria Folha.
A empresa considera a restrição estratégica e enumera as vantagens à disposição do usuário do UOL, maior provedor de acesso e conteúdo de Internet da América Latina.
Muitos leitores não se sentem satisfeitos com a argumentação e lembram que os concorrentes, assim como quase todos os jornais estrangeiros, não cobram pelo acesso.
Mas há também manifestações diárias sobre as lacunas da edição eletrônica, que não são poucas. Um leitor sente falta das cotações do caderno Dinheiro. Outro pergunta onde estão as fichas dos jogos de futebol e a classificação dos campeonatos.
Um terceiro procura em vão pelo mapa de previsão do tempo. Uma leitora que mora no Rio e vai passar um final de semana em São Paulo não encontra o roteiro de teatro para escolher seu programa.
A última falha é excepcional e, pelo que apurei, já foi sanada. As demais são crônicas e têm a mesma origem: a inexistência de gráficos, tabelas e quadros em geral na edição eletrônica.
É certo que se pode achar parte das informações ausentes em outros endereços do próprio UOL, mas não há motivo para aceitar que não constem da Folha, já que existem no papel.
A falta de infografia não priva o leitor apenas de ilustrações de apoio aos textos. Em alguns casos, deixa o conteúdo sem pé nem cabeça.
Há poucos dias, um economista me relatou sua tentativa frustrada de ler uma reportagem do Folhainvest sobre estudo que elegeu os melhores sites de bancos. "Percebi que havia apenas o texto de abertura. O ranking e a pontuação das instituições não foram colocados no ar, inutilizando completamente o material." Sua pergunta: "Como algo que fala sobre serviços online não sai online?"
Mesmo a transposição de textos não é líquida e certa. Há três semanas, seis leitores me procuraram para reclamar porque não havia, na edição eletrônica, um artigo sobre a Grécia publicado no Mais!.
"Não é a primeira vez que isso acontece", protestou o mais irado. Ele havia lido o texto na edição impressa e planejava enviá-lo a um amigo.
O problema, descobri na Redação, é que os direitos do jornal sobre o referido artigo não se estendem à Internet.
Seja pelo espaço ilimitado, seja pela possibilidade de atualização contínua, a vocação do jornal online é superar o impresso em conteúdo. Na prática, porém, o site da Folha ainda é uma versão bastante empobrecida do que o papel oferece.
O jornal reconhece o atraso e vem tomando providências para vencê-lo. O novo editor da Folha Internet, Cássio Starling Carlos, acredita que, até o final de dezembro, será percebido avanço significativo na questão da infografia.
Ele prevê para o início do ano a introdução de recursos que integrem a reprodução do material impresso com o noticiário em tempo real. Acrescenta que a interatividade, até agora inexplorada no site, também estará presente.
"Até por cobrar pelo acesso, o jornal tem a obrigação de oferecer mais do que a transposição do produto em papel", diz.
É saudável que a preocupação exista, porque há leitores cansados de esperar por mudanças nessa área. "São exatamente 2h49. Constato, mais uma vez, que vocês parecem não se preocupar em cumprir horários", escreveu um deles na semana passada. "Dizem que a atualização do site é feita às 2h30, o que já é absurdo. Agora, passar disso é falta de respeito."
O editor não vê possibilidade técnica de baixar o horário de 2h30 no curto prazo, mas afirma que foram tomadas medidas para que ele seja cumprido.
O leitor termina: "Um jornal do porte da Folha deveria dar mais atenção a nós, internautas". Justo. Internautas já são muitos. Não vai demorar muito até que sejam a maioria dos leitores.

Elementar, meu caro

Na quarta-feira, a Folha relatou o caso de uma senhora assaltada, em São Paulo, por homens que se fizeram passar por funcionários da Telefônica.
Segundo a reportagem, a polícia já havia registrado duas histórias semelhantes em semanas recentes, o que levou o jornal a descrever as características do "golpe do telefone": o aparelho fica mudo; falsos técnicos (com crachá, uniforme e ferramentas) se apresentam para realizar o conserto; uma vez dentro da casa, rendem as vítimas e levam o que for possível.
No caso da moradora do Butantã, ameaçada com revólver e faca durante o assalto, foram jóias e dinheiro.
Descrito o golpe, a reportagem passou a mostrar como evitá-lo. "Se houver dúvida, a pessoa deve ligar para a Telefônica e checar se a equipe está a caminho." A empresa "orienta o assinante que receber propostas suspeitas a ligar para o número 104".
Um novo sistema, prometido para o final do ano, incluirá uma central telefônica para a qual o cliente, "de posse das informações do crachá, poderá ligar e verificar se o técnico é ou não cadastrado".
Parecia tudo resolvido. Um leitor, no entanto, apresentou uma dúvida simples: "Como o consumidor vai ligar, se o telefone está mudo?" De fato, se não houver celular à mão, ou outro número na casa, o conselho é inútil.
À primeira vista, trata-se de uma boa anedota. Mais do que isso, é exemplo de um defeito crônico do jornal.
Reportagens ensinam a evitar este ou aquele transtorno, sugerem o que fazer com seu dinheiro e indicam o melhor horário para viajar na véspera do feriado. Informações de interesse, sem dúvida. Acontece que, espremidas as dicas, sobra pouca coisa aproveitável. A maior parte oscila entre a obviedade e o disparate.
Muitas vezes, o que é vendido como orientação ao leitor não passa de reprodução irrefletida do que diz a fonte. Aparentemente, não ocorreu à Redação que as instruções da Telefônica não vão resolver o problema de quem está com a ameaça à porta.
A menos que se recorra à solução criativa sugerida pela secretária do Departamento de Ombudsman: a vítima pode pedir ao ladrão para esperar um minuto enquanto vai até o vizinho, ou ao orelhão mais próximo.

"Eu havia acabado de ler, no artigo do professor Pasquale, a máxima de que "título bom é o que cabe" ", escreveu um leitor na quinta-feira. "Foi quando vi, no caderno Cotidiano, o título "Blecaute deixa Porto Alegre na escuridão". O que vocês queriam? Que o blecaute deixasse a cidade como uma lapinha?"



Índice


Renata Lo Prete é a ombudsman da Folha. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Ele não pode ser demitido durante o exercício do cargo e tem estabilidade por seis meses após o exercício da função. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva do leitor -recebendo e verificando as reclamações que ele encaminha à Redação- e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
Cartas: al. Barão de Limeira 425, 8º andar, São Paulo, SP CEP 01202-900, a/c Renata Lo Prete/ombudsman, ou pelo fax (011) 224-3895.
Endereço eletrônico: ombudsman@uol.com.br.
Contatos telefônicos: ligue (0800) 15-9000; se deixar recado na secretária eletrônica, informe telefone de contato no horário de atendimento, entre 14h e 18h, de segunda a sexta-feira.

Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.