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O mundo visto por lentes sombrias
Houve um repórter que respondia sempre do mesmo
modo quando a emissora em
que trabalhava o acionava para dar as novas da seleção.
Ao "Tudo bem?", devolvia a
exclamação: "Tudo bem!".
Mesmo que o time estivesse
em uma crise danada. Tornou-se conhecido como "Repórter Tudo Bem".
Esse tipo de jornalismo
oba-oba, que se confunde com
o animador de auditório ou o
bobo da corte, distorce tanto a
realidade como o da escola
"cri-cri", habituado a ver o
mundo com lentes sombrias,
mesmo com o sol a pino.
Volta e meia, a Folha se
perde nessa sombra.
No domingo, o que era suposição razoável em artigo
opinativo apareceu como obsessão na peça noticiosa sobre
a decisão do Mundial.
Título: "Jogo do tetra
ameaça ser tétrico". "Linha-fina", abaixo: "Com Milan de
um atacante só e Boca forrado
de volantes, final no Japão
tem tudo para ser amarrada".
À arrogância da adivinhação, somou-se a leviandade da
insistência, na abertura: "A final do Mundial de Clubes em
Yokohama [...] não deverá ser
um jogo atraente".
Foi um jogaço, goleada de 4
a 2 para o Milan.
Pode ser pior, com a partida
já vista, como quando o Barcelona derrotou por 2 a 0 o
Glasgow Rangers em novembro. Esporte titulou "Ofuscado, Ronaldinho dá vez a jovem recordista". O texto seguiu na mesma batida.
Já o diário "El País", de Madri, estampou: "Ronaldinho
lidera o triunfo azul e grená".
"El Periódico", o melhor jornal catalão, encheu a bola do
craque. A publicação especializada "Sport" destacou a "recuperação do brasileiro".
Não é só no futebol. Nos Jogos do Rio, em vez de aguardar o fim da competição de ginástica, a Folha antecipou:
"De potência, Brasil vira
aprendiz no Pan". Logo jorraram medalhas inéditas para a
modalidade.
O jornalismo crítico tem
compromisso com os fatos. Se
os fatos não são trágicos, não
há como relatar tragédias.
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