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OMBUDSMAN
A imprensa no caso Grafite
MARCELO BERABA
Se o jogador argentino
Leandro Desábato xingou o
jogador brasileiro Edinaldo Batista Libânio, o Grafite, de "negro de merda, filho da puta, negrinho", como consta no inquérito policial aberto em São Paulo
após o jogo São Paulo x Quilmes,
ele deve ser punido e sua condenação deve servir de exemplo para os que estimulam o ódio e a
discriminação.
Mas, e se o jogador não pronunciou as ofensas racistas que a
ele foram atribuídas? Neste caso,
estaríamos diante de uma grande injustiça.
O caso Grafite provocou uma
saudável e tardia discussão sobre a questão do racismo no futebol. Desde a noite de 13 de
abril, quando Desábato saiu preso do estádio do Morumbi, o jornalismo esportivo e as páginas
de opinião dos jornais analisaram exaustivamente o caso.
As análises se dividiram em
dois campos: as que acharam
que as providências tomadas
(prisão, algemas, exposição pública do jogador, inquérito policial) foram corretas e as que consideraram que houve exagero.
Os dirigentes do clube argentino
julgaram o episódio uma "armação" e boa parte da imprensa
daquele país tachou a ação da
polícia de "espetacularização" e
a cobertura da imprensa brasileira de "sensacionalista".
Na Folha, vários colunistas escreveram sobre o assunto, mas
acho que dois resumem bem as
diversas posições. Tostão condenou o racismo no futebol, mas
não viu no episódio uma manifestação clara de discriminação.
José Geraldo Couto foi mais duro: "Se for preciso optar, é melhor
o exagero que a omissão".
A principal contribuição que a
Folha deu nesse caso não foi, no
entanto, o espaço que destinou
ao debate, mas a disposição que
demonstrou de fazer jornalismo,
ou seja, de continuar a investigar
o caso. Enquanto praticamente
todo o resto da imprensa manteve o assunto apenas com artigos
de opinião e textos de repercussão, a editoria de Esporte do jornal fez o que tinha de fazer, reportagens.
O inquérito contra Desábato se
baseia na acusação de Grafite,
em duas testemunhas e no vídeo
da TV Globo que teria permitido
a leitura labial das ofensas. Em
sua defesa, Desábato nega os
xingamentos racistas.
Desde quinta, a Folha publica
várias reportagens que questionam essas provas. Na quinta,
editou o resultado de três exames que mandou fazer do vídeo.
Os peritos consultados declararam que não conseguiram ler na
fita as palavras que Grafite afirma que ouviu.
Com essas conclusões, o jornal
procurou as testemunhas, um
amigo e o assessor de imprensa
do brasileiro. Os dois assistiram
ao jogo pela TV e, agora, segundo a Folha, se retrataram. É a
capa do caderno de quinta: "Leitura labial é contestada; amigos
de Grafite recuam".
Na sexta, o jornal informou
que a súmula do jogo não relata
a ofensa e que o relatório do representante da Conmebol menciona "suposto" racismo. O jornal voltou a ouvir uma das testemunhas de Grafite, que informou que o jogador teria sido
pressionado pela direção do São
Paulo para dar a queixa e que
teria havido um acordo entre o
clube e a polícia paulista.
Este caso, portanto, não está
concluído. É possível que Desábato tenha sido racista? É. Mas é
igualmente possível que tenha
apenas ofendido, sem racismo.
Se foi racista, tem de ser julgado.
Se não foi, a discussão é outra. E
o papel da imprensa é o de evitar
uma injustiça.
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