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O foco da Folha
Pesquisa feita com textos publicados de 2004
a 2006 mostra os temas mais recorrentes no jornal -futebol, governo Lula, São Paulo e EUA
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FUTEBOL, GOVERNO Lula, a cidade de São Paulo e
os Estados Unidos. Muitos homens e poucas mulheres. Aí estão resumidos os
principais focos de interesse
da Folha nestes três anos em
que acompanhei a produção
do jornal como ombudsman.
Os dados que apresento
nesta coluna foram levantados a meu pedido pelo Banco
de Dados sob a coordenação
de Carlos Kauffmann. Não é
um estudo exaustivo sobre a
Folha, menos ainda conclusivo, mas revela um pouco como
funciona sua antena jornalística, que assuntos e personagens seus sensores capturaram com mais freqüência.
Embora alguns resultados
pareçam óbvios, o levantamento inédito tem importância por revelar os grandes eixos de cobertura e alguns detalhes que no dia-a-dia passam despercebidos.
Não sei se terá valor para a
Redação, embora, na minha
opinião, a exploração da base
de dados possa servir para reflexão e para ajustes na linha
editorial. Mas, para o leitor
que tem no jornal uma fonte
diária de informação e opinião, os dados podem ajudá-lo
a entender melhor o jornal
que escolheu e a cobrar dele
com mais segurança.
A pesquisa buscou em
231.292 textos noticiosos publicados entre 1º de janeiro de
2004 e 31 de dezembro de
2006 os temas e personagens
mais presentes. A base pesquisada corresponde a 72% dos
textos publicados pelo jornal
porque não inclui artigos, colunas, seções fixas e a Primeira Página. O resultado reflete
a conjuntura de duas eleições
(municipal e presidencial),
três anos de governo Lula, dezenas de escândalos políticos,
uma Copa do Mundo, a morte
de um papa e sua substituição,
a intensificação de ações criminosas em São Paulo, a agudização da crise no Oriente
Médio e a hegemonia contestada dos Estados Unidos.
Os assuntos
Destaco os pontos que me
pareceram mais relevantes ou
curiosos.
1 - O jornal tem quatro temas que se destacam sem concorrentes: futebol (presente
em 10,5% dos textos noticiosos publicados), Lula e seu governo (9%), a cidade de São
Paulo (8%) e os Estados Unidos (6%). Os outros temas estão pulverizados.
2 - Brasil é Brasília. A editoria de política e de assuntos
nacionais tem 64% de seus
textos provenientes de Brasília. Embora seja reflexo da
força política e econômica do
governo central, uma anomalia do sistema que construímos, o percentual confirma
duas fraquezas do jornal que
apontei em várias colunas: as
coberturas da política paulista
e do território nacional.
3 - O noticiário internacional é dominado por dois grandes blocos -Estados Unidos e
islã, aí incluídos a guerra no
Iraque e o Oriente Médio- e
dois blocos menores, a América Latina e a Europa. A África
praticamente não existe.
País por país, os mais noticiados foram EUA, Iraque, Israel, Palestina, Reino Unido,
Irã, Líbano, França, Venezuela e Vaticano, este último devido à morte do papa João
Paulo 2º e à eleição de Bento
16. Ao longo do período, o jornal noticiou mais o Haiti, onde as tropas da ONU estão sob
comando brasileiro, do que a
Argentina. Os números confirmam o crescente interesse
de Mundo por dois países.
Em 2004, o jornal publicou
139 textos sobre o Irã; em
2006, foram 447. Em 2004,
editou 28 sobre a Bolívia; no
ano passado, foram 221.
4 - A editoria de Ciência
tem hoje uma prioridade,
meio ambiente. Os textos que
tratam de ambiente, Amazônia, clima e aquecimento global tiveram espaço crescente
no jornal nos últimos três
anos. Um exemplo: em 2004,
foram publicados 40 textos
sobre a Amazônia; no ano passado, 94.
O segundo assunto é espaço, que teve mais visibilidade
em 2006, com a viagem do astronauta Marcos Cesar Pontes à Estação Espacial Internacional.
5 - O noticiário econômico
tem como origem principal
São Paulo (40% dos textos), o
que se explica pela força econômica do Estado. Brasília
tem um peso bem menor do
que em política, 22%. E, se dividimos o noticiário por segmentos da economia, o sistema financeiro tem bem mais
espaço do que os setores industrial e de serviço.
6 - Dois grandes blocos perderam espaço em Cotidiano
-saúde e educação- e um
terceiro se manteve no mesmo nível -violência e criminalidade. A queda maior é em
educação, e foi contínua:
1.296 textos em 2004, 1.076
em 2005 e 844 em 2006. As
maiores quedas ocorreram na
cobertura que tinha mais presença, o ensino superior e o
vestibular. Em saúde também
quase todos os subtemas tiveram menos espaço.
O noticiário de violência, no
entanto, permaneceu estável,
com mais ou menos o mesmo
espaço (5.050 textos nos três
anos) de saúde (5.149) e com
bem mais espaço que educação (3.216). Há dois aspectos
notáveis em 2006 em relação
a 2002: a explosão de textos
sobre o PCC (de 30 textos para 1.405), explicada pelos ataques organizados a partir dos
presídios, e a maior presença
de notícias com enfoque em
segurança pública (528 para
1.144).
Uma lupa na cobertura de
favelas: de 712 textos levantados que tinham favela como
palavra-chave, 72% a associavam a morte, violência, assassinato, tráfico e outros crimes.
7 - O caderno poderia se
chamar futebol, e não Esporte. Na relação de 27 modalidades esportivas pesquisadas,
75% dos textos foram sobre
futebol. Distantes, muito distantes, vieram automobilismo, tênis, basquete e vôlei
que, juntos, perfizeram mais
18%. E o resto é resto.
O ranking dos clubes mais
noticiados: Corinthians
(3.540 textos), São Paulo
(3.223), Palmeiras (2.525) e
Santos (2.491).
8 - Há quatro grandes blocos
de cobertura na Ilustrada:
música, cinema e, num patamar inferior, literatura e televisão. Televisão não inclui as
grades de programação nem
as colunas. Depois desses blocos vêm, distantes, teatro, artes plásticas, gastronomia,
dança e moda.
Os personagens
As figuras que mais apareceram ajudam a contar a história
do período. No conjunto
do jornal, dois nomes se sobressaem: Lula e Bush. Por
editoria:
Brasil - nos três anos, a
editoria teve um personagem
principal, Lula, e, a léguas,
Geraldo Alckmin, José Dirceu,
José Serra e Marcos Valério
de Souza. Entre os dez primeiros aparecem ainda Antonio
Palocci Filho, Marta Suplicy
e três envolvidos em escân-
dalos, Roberto Jefferson, Waldomiro Diniz e Severino
Cavalcanti.
Mundo - O primeiro é Bush,
disparado. Bem atrás vêm
John Kerry, Hugo Chávez (seguramente assume a vice-liderança em 2007), João Paulo 2º
e Ariel Sharon.
Ciência - O noticiário não é
em cima de nomes, mas de temas, por isso tem apenas um
destaque, o astronauta Marcos
Cesar Pontes.
Dinheiro - Lula, Guido
Mantega (estava no BNDES
antes do Ministério da Fazenda), Antonio Palocci Filho,
Henrique Meirelles e Luiz
Fernando Furlan. Em seguida,
vem Edemar Cid Ferreira, ex-dono do Banco Santos e condenado por vários crimes.
Cotidiano - Os cinco primeiros são políticos de São
Paulo -José Serra, Geraldo
Alckmin, Marta Suplicy, Gilberto Kassab e Cláudio Lembo- e, em seguida, vem Suzane von Richthofen, condenada
pelo assassinato dos pais em
2002.
Esporte - Numa lista de 22
nomes que mais apareceram,
17 eram do mundo do futebol.
O curioso, no entanto, é que o
jornal deu mais espaço para
técnicos do que para jogadores. Os cinco primeiros: Emerson Leão, Carlos Alberto Parreira, Ronaldo, Vanderlei Luxemburgo e Robinho. Entre os
22, apenas uma mulher, a ginasta Daiane dos Santos.
Ilustrada - Não há nenhum
nome onipresente, como em
política ou internacional. Os
que mais apareceram: Chico
Buarque, Fernando Meirelles,
Gilberto Gil, Michael Jackson
e Walter Salles. Três compositores e intérpretes (um político) e dois cineastas. Na lista,
apenas uma mulher, Maria Bethânia.
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Marcelo Beraba é o ombudsman da Folha desde 5 de abril de 2004. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Não pode ser demitido durante o exercício da função e tem estabilidade por seis meses após deixá-la. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores, recebendo e verificando suas reclamações, e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
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