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Quando os anúncios incomodam
Não é a publicidade o interesse essencial do leitor, e sim o jornalismo; para honrar o brinde, anúncios devem gerar benefícios jornalísticos
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UM LEITOR telefonou
para contar que no domingo passado desistiu
de ler a reportagem eleita para
a manchete porque "cansou de
caçá-la entre os anúncios".
Também penei. Garimpei os
textos nas páginas A4, A8 e
A13. Entre eles, uma fartura de
publicidade.
"Está difícil achar os artigos
da Folha nessa salada de prédios e condomínios", desabafou uma leitora. Outro leitor
cutucou: "A Folha é um jornal
de notícias com alguns anúncios ou um jornal de anúncios
com algumas notícias?".
Avolumaram-se as manifestações de leitores após a edição de 10 de novembro, com
200 páginas, recorde da Folha
em um sábado. Muitos somaram os anúncios nos 16 cadernos: os de página inteira foram 82. A publicidade tomou mais da metade do espaço. Em
si, o boom publicitário vale
um festejo. Expressa descolamento em relação aos EUA. O
"New York Times" noticiou
que os grandes jornais americanos vendem hoje 10% menos exemplares que em 2000.
No mesmo período, a queda
da Folha, diário nacional de
maior circulação paga em setembro, foi de 30% (de 441 mil
para 307 mil por dia).
É tendência mundial: jornal
de informação geral dito de
prestígio perde leitores em
papel e ganha na internet.
Na receita com publicidade,
deu-se o contraste. O New
York Times Media Group, na
mesma passada da mídia impressa americana, faturou
5,4% menos no segundo trimestre de 2007 em comparação com o do ano anterior.
No Brasil, o Projeto Inter-Meios constatou que o pulo
dos jornais do terceiro trimestre de 2006 para o deste ano
foi de 26%. Pedi confirmação,
e a Redação não respondeu, à
informação corrente na empresa: o faturamento da Folha em outubro teria sido o
maior obtido em um só mês.
Nem o crescimento da receita com anunciantes a Secretaria de Redação divulgou.
Afirmou apenas que "o faturamento comercial neste ano está acima do esperado".
Busquei uma informação
pública, no jornal "Meio &
Mensagem" de 27 de agosto: o
diretor-executivo comercial
da Folha, Antonio Carlos de
Moura, disse que até julho o
salto foi de 8% (do jornal impresso; o da Folha Online foi
de 20%, mas sua fatia no bolo
é ainda pouca expressiva).
A publicidade constitui a
fração majoritária da receita,
confirma o "Manual da Redação", segundo o qual "os anúncios são parte do conjunto de
informações que o leitor procura todos os dias no jornal".
Concordo: quem quer comprar um apartamento folheia
jornal. A pujança do mercado
imobiliário é a principal responsável pelo aquecimento,
secundada pela venda de automóveis, em meio à expansão
da economia.
Mas não é a publicidade o
interesse essencial dos leitores, e sim o jornalismo. Para
honrar o brinde, os anúncios
devem gerar benefícios jornalísticos, e até agora isso não
ocorreu. Não só porque a leitura nos fins de semana se assemelha a uma corrida de obstáculos, mas porque os recursos que chegam não se convertem em mais investimentos, a considerar o que se lê.
Não se notaram progressos
nas pautas, nas reportagens,
nas edições. Parece fraquejar
a ambição jornalística.
A Redação assegura que "o
crescimento de receita publicitária permite à empresa obter um resultado melhor e a
continuar a investir em um
jornalismo de qualidade".
Então sugiro: a Folha poderia reinstalar correspondentes país afora (a começar por
Belém) e no exterior (por Pequim) e recusar tantas viagens
gratuitas, a "convite" de quem
se favorece delas. E manter,
entre as páginas editoriais, a
publicidade no limite do bom
senso -parte dela se agruparia em cadernos específicos.
Anúncios são bem-vindos.
Mas eles devem propiciar um
jornal melhor, e não configurar um estorvo aos leitores.
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Mário Magalhães é o ombudsman da Folha desde 5 de abril de 2007. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Não pode ser demitido durante o exercício da função e tem estabilidade por seis meses após deixá-la. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores, recebendo e verificando suas reclamações, e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
Cartas: al. Barão de Limeira 425, 8º andar, São Paulo, SP CEP 01202-900, a/c Mário Magalhães/ombudsman,
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