São Paulo, domingo, 26 de maio de 2002

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Um alerta

Na semana que passou, os marqueteiros do PT puderam respirar aliviados, ao menos quanto à Folha. Fatos bastante incômodos surgiram envolvendo o partido, mas o jornal, em muitos casos, tratou-os com bem menos relevância do que mereciam.
Na sexta-feira 18, a Folha levou um furo do "Estado de S.Paulo", que noticiou o deslocamento para publicidade de dinheiro que deveria pagar programas sociais da prefeitura paulistana.
Ao recuperar o tema sábado, o jornal adicionou uma revelação: teria havido desvio para publicidade também de verba da saúde, desde 2001. Apesar de estarmos em ano eleitoral, numa campanha em que a publicidade ocupa papel, como se sabe, primordial, optou-se, no entanto, por não dar a informação na capa, que é a vitrine do jornal.
Notícia divulgada por Elio Gaspari no domingo sobre uma licitação problemática em Ribeirão Preto (administrada pelo coordenador do programa de governo de Lula) também ficou só em página interna.
Na quarta, só uma pequenina matéria saiu sobre tema que foi manchete da terça no "Correio Braziliense": acusações de desvio de dinheiro de entidade sindical do DF, em 98, para campanhas eleitorais, inclusive do PT.
Na quinta, o secretário João Sayad (Finanças) admitiu "erro formal" da prefeitura no lançamento de gastos com publicidade; o assunto, grave, tampouco ganhou espaço na capa.
Veio a sexta, e jornais concorrentes publicaram uma frase curiosa de Marta Suplicy: "A parte jurídica é o de menos", disse a prefeita, expondo uma formulação reveladora, vinda da autoridade que comanda a principal administração do PT, vitrine mais exposta do partido cujo pré-candidato encabeça todas as pesquisas de intenção de voto.
A secretária de Redação Paula Cesarino Costa afirma que não houve chamada sábado porque, em que pese o "mérito" da reportagem, "segundo a apuração da Folha até aquele momento, não havia consenso entre especialistas de que o procedimento da prefeitura era irregular"; além disso, "o valor em questão não chegava a ser expressivo".
No caso do "erro formal", diz a jornalista, "optamos por manter a mesma postura em relação ao tema". Ela argumenta que o que Sayad admitiu foi um erro de caráter "formal" e que o secretário defendeu o destino dado à verba. Ademais, "até aquele momento, não dispúnhamos de elementos para dimensionar a real possibilidade de haver um processo de improbidade administrativa contra a prefeitura". A opção foi priorizar outras chamadas.
Sobre a frase de Marta, só não saiu por "descuido da edição".
Seria leviano, aqui, dizer que o jornal resolveu "dar moleza" ao PT na campanha eleitoral em pleno curso. Diante da importância dos fatos surgidos na semana, porém, não parece equivocado considerar que ele, objetivamente, acabou ficando perto disso. Vale como alerta.
A Folha precisa definir melhor o que quer no noticiário eleitoral. Entre o marketing e a vida concreta, entre questões de programa ou propostas e a retórica pura, onde está o equilíbrio? Como e o que priorizar?
Sobre o PT, tema desta coluna: diferentemente de campanhas anteriores, o partido controla cidades e Estados de imenso peso político e econômico, com as possibilidades positivas e os riscos que isso implica. É esse o PT real, não o de Duda Mendonça.


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