São Paulo, domingo, 28 de setembro de 2008

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CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA - ombudsman@uol.com.br

Uma controvérsia que dura 55 anos


A divergência de títulos sobre os Rosenberg na capa e em página interna mostra que o jornal não segue uma linha estrita com objetivo predeterminado

PARA quem viveu a Guerra Fria, o caso Rosenberg teve importância extraordinária. Julius e Ethel foram executados na cadeira elétrica da prisão de Sing Sing em 19 de junho de 1953 e considerados mártires por simpatizantes das teses de esquerda por mais de cinco décadas.
Eles foram acusados de espionar para a União Soviética e passar aos inimigos ideológicos dos Estados Unidos segredos militares, inclusive sobre a bomba atômica, que teriam permitido aos comunistas produzirem a sua.
O processo jurídico foi atabalhoado; a polarização política, no auge do macarthismo, contaminou os procedimentos legais. A opinião pública se dividiu radicalmente entre os que tinham certeza da culpa e da inocência dos dois.
No dia 19, o jornal "The New York Times" publicou entrevista com um dos co-réus do casal Rosenberg, Morton Sobell, que aos 91 anos pela primeira vez admitiu publicamente que tanto ele quanto Julius haviam espionado, mas que Ethel, embora soubesse das atividades do marido, não participara delas.
O "Times" também noticiou que depoimentos até agora sigilosos sobre o julgamento haviam sido divulgados ao público e reforçavam a tese da inocência de Ethel Rosenberg.
No sábado, dia 20, a Folha publicou texto sobre o material do "Times" com chamada de capa. O título na primeira página era para a confissão de Sobell; o da página interna para a provável inocência de Ethel Rosenberg.
Diversos leitores se manifestaram para protestar contra o título interno. Todos se referiram a um artigo de Olavo de Carvalho que circula na internet, no qual este jornal é denunciado por "não se vexar de inverter o preceito básico do noticiário jornalístico, para atenuar o impacto de uma notícia que poderia pegar mal -ó horror!- para a reputação ilibada dos comunistas".
Carvalho é um instigante polemista, bem preparado intelectualmente, que defende posições muito conservadoras. Ele enxerga neste jornal a intenção deliberada de distorcer a realidade para favorecer grupos ideológicos ou partidos políticos de esquerda.
Exatamente como os que se localizam no pólo oposto ao seu no espectro das idéias e acusam a Folha de conspirar a favor da direita.
Neste caso, como na maioria dos outros, é difícil crer em bruxas. O simples contraste entre os dois títulos que o jornal usou para dar a notícia comprova que ele é feito por pessoas que pensam diferentemente e não segue nenhuma linha estrita com objetivo predeterminado.
Eu acho que a novidade era a confissão de Sobell e que a primeira página acertou. Mas quem acompanha o caso Rosenberg sabe que há pelo menos 15 anos já não restava muita dúvida sobre a culpa de Julius. A divulgação de documentos da era soviética a comprovava. Portanto, achar que a reiteração de sua culpa era secundário também se justificava.


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