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Bicho de sete cabeças

Se os jovens 'caras-pintadas' eram vistos com simpatia, os 'rebeldes do asfalto' assustam e ainda precisam ser decifrados

A multidão que tomou as ruas das capitais do país deixou desnorteados não apenas os políticos e intelectuais mas também a imprensa.

Com uma força inesperada, o movimento conseguiu dobrar prefeitos e governadores, levou a presidente a desfiar promessas e impôs, por um bom tempo, o tom da cobertura.

Se os primeiros protestos, menores mas ruidosos, foram descritos com as cores do vandalismo, o discurso mudou depois de uma enxurrada de críticas nas redes sociais. O que se via na semana passada, principalmente na televisão, era uma preocupação obsessiva em sublinhar que as passeatas são "pacíficas" e que apenas um "pequeno grupo" aparece no final de cada ato para depredar, pichar e saquear.

Mesmo assim, os repórteres sentiram nas ruas a animosidade fomentada no mundo virtual. Jornalistas da Rede Globo foram hostilizados, carros da Record e do SBT foram queimados, repórteres não conseguiam entrar ao vivo do meio das passeatas.

No "Jornal Nacional" de quinta-feira, William Bonner precisou dizer que o "trabalho da imprensa é exatamente para dar voz às reivindicações de todos os manifestantes" e lamentou que "minorias [...] tentem intimidar o trabalho da imprensa, que está fazendo um serviço de utilidade pública".

Não é mais verdade que os manifestantes precisem da mídia para lhes dar voz. Isso mudou com a internet, mas Bonner tem razão em falar de "utilidade pública". Cabe ao jornalismo explicar aos 192 milhões de brasileiros que não foram às ruas o que está acontecendo no país, com a maior objetividade possível.

Não é tarefa simples. Como resumir manifestações com reivindicações caleidoscópicas? Como analisar esse mal-estar urbano que ninguém percebeu que existia? Quem entrevistar, se são milhares e não há líderes? Esse tsunami popular entrará para a história ou ficará restrito à vitória dos 20 centavos?

Enquanto não se decifra a insatisfação que tomou o asfalto, a cobertura se reveza em um "morde-assopra", dependendo do grau de vandalismo dos protestos. Na quinta-feira, a Folha fez uma capa em tom triunfalista, que anunciava que "PROTESTOS DE RUA DERRUBAM TARIFAS", escrito assim, tudo em letras maiúsculas. No dia seguinte, o destaque era a violência se espalhando pelo país.

A vida era bem mais fácil no século passado, quando os simpáticos caras-pintadas queriam derrubar Fernando Collor de Mello.

Como hoje, os estudantes rechaçavam a participação de partidos políticos, mas, na época, havia uma bandeira clara e digerível (o impeachment de um presidente envolvido em denúncias de corrupção).

Não tinham inventado a web e o clima com a imprensa era de congraçamento. Nos atos, nada de vandalismo. "Uma explosão de cor tomou ontem o coração de São Paulo e de dezenas de cidades em todo o território brasileiro", comemorava o editorial "O alerta das ruas", de 26 de agosto de 1992, que falava da "indignação dos [adolescentes] que não perderam a capacidade de se revoltar com o espetáculo de afronta ao interesse público".

As revoltas urbanas de hoje são mais difíceis de classificar e, se for o caso, de abraçar. Porque, como bem definiu Gilberto Gil, elas mesclam a festa com o banditismo. É a "rave-arrastão".

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ERAM MAIS DE 65 MIL

O cálculo de que havia 65 mil pessoas no protesto de segunda-feira em São Paulo provocou uma grita nas redes sociais. Quem esteve lá garante que passavam de 100 mil manifestantes.

O Datafolha, que fez a contagem, explica que essa estimativa era apenas do público que estava concentrado no largo da Batata antes de começar a passeata.

O instituto não conseguiu medir a manifestação em movimento, porque o percurso não foi definido com antecedência, como aconteceu com a Parada Gay ou a Marcha para Jesus. Não entra na conta dos 65 mil quem aderiu à marcha enquanto ela passava por diferentes pontos da cidade. Faltou à edição deixar isso claro.

Em meio a tantas incertezas, o Datafolha tem jogado luz sobre quem são esses manifestantes.


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