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Vai que cola

Folha reproduz dado de assessoria de imprensa sobre recorde de audiência de programa humorístico

A "Ilustrada" publicou --duas vezes-- que o humorístico "Vai que Cola", do Multishow, é o programa mais visto na TV paga nos últimos dez anos. Segundo a Folha, mais de 11 milhões viram os 20 primeiros episódios da série, o que seria a melhor marca alcançada por um programa previamente gravado (excluídas as transmissões ao vivo).

O Brasil tem 17 milhões de domicílios com TV paga, o que dá, segundo a Anatel, 54,3 milhões de espectadores (3,2 pessoas por casa). O dado do Multishow significa que 21% dos que assistem à TV por assinatura já viram o "Vai que Cola".

Se você não faz parte dessa multidão, segue um resumo do programa: trata-se de uma espécie de "Sai de Baixo" sem as estrelas globais. O cenário é o Méier, subúrbio do Rio, onde está a pensão da Dona Jô. Sobre um palco giratório, circulam o Máicol (jovem forte-burrão), a Jéssica (filha à toa da Dona Jô), o Ferdinando (gay pobretão que se acha sofisticado) e o Valdomiro (malandro metido a esperto), entre outros.

A informação de que a série bateu recorde de audiência foi publicada na coluna Outro Canal em 16 de agosto e repetida, 14 dias depois, em um destaque da programação ("Programa mais visto da TV paga, Vai que Cola' encerra temporada").

O que a Folha não contou é que o cálculo da audiência foi feito pelo próprio Multishow. A reportagem atribuiu o número ao Ibope e registrou a alegria do diretor do canal ("Quando vieram os números, achei que havia um engano do Ibope.").

Só que o instituto informa que não fez essa conta, afirma que não trabalha com a categoria de "programa previamente gravado" e aconselha: "Das próximas vezes, sugerimos que vocês nos consultem antes da publicação".

O Multishow pegou os dados de audiência do Ibope, usou um critério chamado de "cobertura" (que soma espectadores diferentes por episódio) e aplicou sobre o total de pessoas que assistem à TV paga (base da Anatel).

O problema é que o Ibope mede a TV paga em nove mercados, que não representam todo o Brasil. Não dá para misturar duas bases diferentes. É como se uma pesquisa eleitoral pegasse a intenção de voto de Dilma em nove capitais e projetasse quantos votos ela vai receber em todo o país.

Além disso, é difícil falar em audiência de TV paga ao longo de dez anos porque as bases também são diferentes. Em 2003, a amostra era de seis locais (São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Curitiba, Distrito Federal e Porto Alegre). Hoje, foram incluídos Salvador, Campinas e Florianópolis. Comparam-se alhos com bugalhos.

A Redação demorou a reconhecer o erro, mas publicou, na quinta-feira passada, uma correção. O grave é que o jornal engoliu um número fornecido pela assessoria de imprensa do canal e não checou com a fonte primeira --o Ibope. "Ouvimos concorrentes do canal, que confirmaram o dado do Multishow", diz a "Ilustrada".

Embora a cobertura de TV da Folha dê uma ênfase enorme à audiência, os números são sempre obtidos de segunda mão. O Ibope vende os relatórios às emissoras e exige confidencialidade. Elas vazam os números que lhes interessam --para autopropaganda ou para desidratar um concorrente.

Ao jornalista cabe desconfiar dos números mais vistosos e lembrar-se da máxima de que "estatísticas bem torturadas dizem qualquer coisa". Os canais de TV, do mesmo modo que as empresas, produzem centenas de dados positivos, oferecidos diariamente à imprensa. É a aposta no vai que cola...

"QUAL É A TUA, FOLHA?"

O editorial "Julgar serenamente", de quarta-feira passada, reafirmou que a Folha é contra punir com prisão os condenados pelo mensalão. "Este jornal não vê motivo de satisfação no espetáculo de trancafiar, entre aplausos, este ou aquele figurão."

Leitores reagiram com indignação. "Qual é a tua, Folha? Mudei eu ou mudastes tu, tua linha editorial e teus valores? Como leitor e fã, me sinto traído", escreveu o empresário Marcelo Cherto, 59.

A posição histórica do jornal, de antes do mensalão, é de que só deve ir para a cadeia quem representa perigo para a sociedade. Sobre os réus de agora, o jornal havia se pronunciado, da mesma forma, em outubro do ano passado.

Pode-se concordar ou não com a posição da Folha, mas não é correto chamá-la de incoerente.


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