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Pablo Ortellado e Luciana Lima

Dados privados, políticas públicas

Se já não dá para estimar se há meias-entradas demais, quem vai aferir que o benefício será efetivamente concedido no limite de 40%?

No dia 27 de abril, publicamos um artigo ("Direito sem ordem de chegada") em defesa da meia-entrada ilimitada para jovens e idosos. Nosso argumento era que a meia-entrada é uma forma de subsídio cruzado, no qual os adultos subsidiam os jovens e os idosos.

Argumentamos que a limitação da meia-entrada criaria uma situação absurda, na qual os estudantes que comprassem ingressos além da cota subsidiariam os estudantes que tivessem comprado antes, rompendo o princípio da progressividade.

E dissemos que a promessa dos produtores de reduzir os preços dos ingressos deveria ser vista com ceticismo, já que fala semelhante feita pelas editoras na ocasião em que receberam isenção não se cumpriu.

Essa última observação ensejou resposta da presidente da Câmara Brasileira do Livro (CBL). Em artigo nesta Folha ("O preço do livro", 5/5), ela argumenta que, desde a isenção do PIS/Pasep, em 2004, o preço do livro caiu 44,9%. E utiliza como evidência um estudo encomendado pela própria CBL à Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe).

Os números, por si só inverossímeis, merecem reflexão mais detida porque apontam para o problema mais amplo do uso de dados de empresas privadas na orientação de políticas públicas.

O levantamento buscou estimar o preço médio dos livros a partir de questionários enviados às editoras. Uma das dificuldades desse tipo de pesquisa deve ser destacada: os dados são autodeclarados e não podem ser auditados.

No fundo, dizer que a pesquisa da Fipe indicou que o preço do livro caiu 44,9% significa apenas que as próprias empresas disseram que baixaram o preço. E elas disseram isso no contexto das críticas do ex-presidente Lula de que, a despeito da isenção, o preço do livro não tinha caído. Como as editoras estavam interessadas em demonstrar essa redução, seu depoimento não é crível.

Como contraponto, podemos buscar os dados públicos do maior programa de compras governamentais, o Programa Nacional do Livro Didático. Tomando o ano de 2004 como base e corrigindo os valores pela inflação, notamos nos últimos oito anos apenas uma pequena variação (em torno de R$ 7,50, em valores de 2012). É de chamar a atenção a disparidade entre o dado público, que indica estabilidade dos preços, e o dado privado, que indica uma redução de quase 45%.

Voltando ao tema do primeiro artigo, podemos transpor a situação do mercado editorial para o debate sobre a meia-entrada. Matéria da "Ilustrada" de 6/5 utiliza dados de produtores e empresários para dizer que a concessão de meias-entradas seria de 65% a 80% dos ingressos. Esses dados, produzidos por agentes declaradamente interessados na redução do benefício e que não podem ser auditados, deveriam orientar o debate público sobre um direito dos estudantes brasileiros?

Se já não temos dados confiáveis para estimar com imparcialidade se há meias-entradas demais, quem vai aferir que o benefício será efetivamente concedido no limite de 40% ou verificar se os preços caíram como prometido? Fica a lição do mercado editorial.


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