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Opinião

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André Singer

Câmara escura

Ao manter a cadeira de Natan Donadon, a Câmara dos Deputados deu insólita contribuição para o confuso momento político que estamos vivendo. Como que a confirmar um diagnóstico tão errado quanto corrente, segundo o qual a moralidade precisaria ser imposta ao Legislativo pelo Supremo Tribunal Federal ou pela fúria das manifestações, 131 parlamentares (cerca de um quarto da Casa) tiveram a pachorra de votar pela absolvição do colega preso.

Surpreendendo até o próprio beneficiado, é difícil explicar o acontecido. Duas hipóteses circulam nos jornais. A primeira refere-se à solidariedade do baixo clero ao companheiro detido, potencializada por discurso apelativo e marcas de algemas. A segunda, uma suposta estratégia para favorecer os condenados da ação penal 470. Vejamos.

É sabidamente numeroso o rol de legisladores atingidos por processos criminais. A Lei da Ficha Limpa foi criada tendo em vista tal realidade. Embora desconheça estudos a respeito, desconfio que o envolvimento de representantes do povo com atividades ilícitas possa estar aumentando. Por exemplo, em entrevista publicada pela Folha no domingo passado, a cientista política Maria Helena Moreira Alves descreve um processo, que poderíamos chamar de neocoronelista, por meio do qual as milícias do Rio de Janeiro agem para eleger seus candidatos nas comunidades.

Nesse caso, sufragar a favor de Donadon iria além da mera camaradagem. Tratar-se-ia de uma posição definida em defesa da impunidade. O quadro brasileiro é explosivo porque, simultaneamente, cresceram os mecanismos de controle da mesma: Ministério Público, Polícia Federal independente, imprensa livre, Judiciário pró-ativo e uma cidadania disposta a se mobilizar. Se for assim, o choque das duas tendências ainda promete.

Quanto à segunda possibilidade, se houve intenção de favorecer os réus da ação penal 470, o tiro saiu pela culatra. Depois do justificado barulho causado pela absolvição de Donadon, é provável que a PEC do voto aberto seja aprovada e, com ela, fiquem reduzidas as chances de os quatro deputados envolvidos no chamado mensalão terem seus mandatos preservados. Dada a esperteza do meio, parece pouco provável manobra tão tosca.

Ainda assim, os 50 parlamentares que registraram presença em plenário, mas não votaram, devem explicações ao público. Pelo fato de o voto ter sido secreto, acabou por recair neles a principal identificação dos que, aparentemente, quiseram poupar Donadon. Em particular sobre os 11 do PT, pela óbvia conexão com a ação penal 470 e pela expectativa de comportamento ético que, no passado, caracterizou o partido.


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