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Mara Gabrilli

TENDÊNCIAS/DEBATES

Os desafios do "Viver sem Limite"

Dados os números alarmantes de um Brasil de deficiências, a iniciativa do governo traz à tona um imperativo pouco aplicado: ações de prevenção

A voz embargada de Dilma Rousseff marcou o início da cerimônia no Palácio do Planalto para o lançamento do Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, ocorrida no último dia 17.

Diante de um público que incluía as filhas do deputado Romário e do senador Lindbergh, ambas com síndrome de Down, a presidente não conteve as lágrimas ao afirmar que, em momentos assim, valia a pena ser presidente do Brasil.

Dilma entendera, finalmente, o quão deficiente tem sido a nação durante décadas de um governo assistencialista, mas pretensamente igualitário? É o que se espera do Dia Internacional da Pessoa com Deficiência, que foi celebrado em 3/12.

É também o que aguardamos para os próximos anos, quando o governo federal efetivamente passará a cumprir as metas do "Viver Sem Limite", um pacote dirigido à população com deficiência, com previsão orçamentária de 7,6 bilhões.

Segundo dados do Censo 2010, o Brasil já conta com 45,6 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência. O número corresponde a 23,91% da população. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, nos países de Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) elevado, esse percentual chega a 1%.

Dados os números alarmantes de um Brasil de deficiências, a nova iniciativa do governo traz à tona um imperativo pouco aplicado no país: as ações de prevenção.

Estima-se que 90% dos casos de deficiência visual estejam concentrados em nações em desenvolvimento, e a maior parte deles poderia ser evitada. O glaucoma e a catarata são as principais causas de cegueira na população brasileira adulta. Já na infância, esses problemas são decorrentes de baixa nutrição e infecções.

Parece-me paradoxal que, hoje, aguardemos a aparição de um tetraplégico dando o pontapé inicial na bola da Copa de 2014, a partir das possibilidades da neurociência e dos estudos do talentoso cientista brasileiro Miguel Nicolelis, enquanto problemas como a falta de saneamento básico ainda ocasionem doenças capazes de causar cegueira em nossas crianças.

Obstáculo tão grande quanto garantir o acesso à saúde será solucionar a questão da educação inclusiva, tendo em vista o novo decreto nº 7.611/2011, que modifica a exigência da matrícula de alunos com deficiência na escola comum, permitindo que esta também ocorra em uma instituição especializada.

Não podemos ignorar o descontentamento de parte dos defensores da causa, que enxerga na mudança um retrocesso ao processo de inclusão -tendo em vista que a criança ou jovem com deficiência, mesmo tendo acesso à educação na escola especial, estaria segregado do ambiente comum a todos os demais estudantes. Portanto, caberá ao governo não permitir que as escolas regulares se eximam da responsabilidade de se adaptar para alunos com deficiência.

A presidente parece ter entendido que a deficiência está no meio, e não no indivíduo. Ao tentar me cumprimentar com um aperto de mão, Dilma deparou-se, possivelmente pela primeira vez em sua vida, dado seu visível estado de choque, com alguém que não podia mexer braços e pernas.

Mas hoje ela sabe que muitas das medidas propostas e acatadas no programa são frutos do trabalho de um grupo de parlamentares com deficiência. Agora, caberá ao seu governo cumprir o que o plano prevê e sanar o que há décadas vem sendo negligenciado a uma população que não parece fazer parte da sétima economia do mundo.

A mim, a você e a toda a sociedade caberá fiscalizar e cobrar essa tão esperada igualdade social.

MARA GABRILLI, 44, psicóloga e publicitária, é deputada federal pelo PSDB-SP.

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br

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