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Editoriais Educando os pais Texto final da Lei da Palmada aprovado em comissão da Câmara dos Deputados tenta conciliar opiniões sobre o tema É comum, nas famílias modernas, a situação em que filhos pequenos rapidamente aprendem a interpretar a seu favor as regras impostas pelos mais velhos. Um "não pode", conforme o tom com que foi dito, pode bem significar o seu contrário; e há recomendações que, embora feitas com sinceridade ("coma mais", "experimente a verdura", "não provoque sua irmã"), não serão, e disso sabem todos, seguidas ao pé da letra. Acontece algo parecido com o texto final da lei que proíbe castigos físicos às crianças, aprovado agora em comissão da Câmara dos Deputados. Fruto de uma negociação entre dois setores igualmente representativos da sociedade, não é que a chamada Lei da Palmada seja insatisfatória. Muito ao contrário: aponta para uma visão pedagogicamente adequada da vida familiar, privilegiando o diálogo e formas de autoridade paterna que dispensem, como em todo aspecto da vida civilizada, o recurso à intimidação e à força bruta. O texto tornou-se, entretanto, algo difícil de interpretar, e não por acaso. O fato é que a própria sociedade, para não dizer muitos educadores, mostrou-se dividida em torno da questão. Nas áreas mais retrógradas, quase sempre representadas por deputados da bancada evangélica, o recurso ao castigo físico ainda é uma prerrogativa que muitos pais não se dispõem a abandonar. Orgulham-se, até, de procedimentos que consideram "formadores do caráter" de seus filhos -quando o que se forma, frequentemente, nada mais é que o ressentimento, o trauma e a hipocrisia. No outro extremo, a insegurança quanto à própria autoridade pode levar apenas à completa ausência de limites, que deforma o comportamento de tantas crianças acostumadas a ver os pais intimidados diante de seus menores caprichos. Reprovando claramente, como deveria ser, a agressão feita a título supostamente educativo, a Lei da Palmada procurou também distinguir, de forma tácita, entre os casos desse tipo e as situações que seria exagero criminalizar. Decidiu-se coibir, assim, o uso do castigo físico quando resultar em "sofrimento" ou "lesão". Proíbe-se, com isso, o tapinha que uma criança incontrolável venha ocasionalmente a receber? Difícil responder com certeza. Terminará cabendo ao juiz avaliar se é justificável a intervenção do Estado sobre os procedimentos dos pais, encaminhando-os a um acompanhamento psicológico e a cursos de orientação. No fundo, vale para a Lei da Palmada, e para os próprios pais, o princípio que a orienta na relação com as crianças: melhor educar do que punir. Excetuados os casos mais extremos, certamente campanhas públicas de esclarecimento tendem a ser mais produtivas, num âmbito geral, do que as intimações da Justiça para atingir o que se pretende: um clima de civilização e respeito que, tanto por parte de pais como de filhos, tantas vezes parece faltar no cotidiano brasileiro. Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros |
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