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Hélio Schwartsman

Deveres da amizade

SÃO PAULO - "A Filosofia Como Crítica da Cultura", de Paulo Ghiraldelli Jr., é um livro provocante. Trata-se de um conjunto de pequenos ensaios sobre temas variados, que vão do Pica-Pau (Woody Woodpecker) a periguetes, sem deixar de passar por Kant, Pascal e Jesus, como convém a um filósofo.

Sempre numa linguagem pop, Ghiraldelli tenta usar assuntos do cotidiano para instigar reflexões filosóficas no leitor, na melhor tradição do "thaumázo" (maravilhar) aristotélico. Em vários dos textos ele consegue cumprir esse desígnio.

Como não dá para comentar tudo, concentro-me no ensaio sobre a amizade, que levanta uma questão recorrente em meus artigos: é possível ser justo e leal para com os amigos ao mesmo tempo?

É claro que tudo depende de como definimos os termos, mas não é de hoje que filósofos apontam uma incompatibilidade entre o relacionamento especial que caracteriza a amizade e os princípios morais exigidos por alguns dos principais sistemas éticos. É impossível, por exemplo, ser totalmente imparcial, como cobra o consequencialismo, e dar preferência às necessidades dos amigos. Ou, num exemplo ainda mais dramático bolado por Michael Stocker, o bom kantiano que vai todos os dias visitar o amigo que se recupera no hospital porque acha que este é seu dever acaba rebaixando a amizade, ao colocar a ideia de dever acima do interesse genuíno pela pessoa física do paciente.

Ghiraldelli, sem deixar de reconhecer a dificuldade, fica com os amigos, atribuindo grande parte da confusão a uma banalização dos vários significados de "amor" e "philia" (amizade). Pode ser, mas tenho uma visão um pouco mais trágica. Acho que nosso senso moral é o resultado não projetado de diferentes pressões seletivas, o que praticamente nos condena a ficar pulando de um sistema ético para outro sem jamais satisfazer nossas intuições.


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