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Opinião

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Hélio Schwartsman

O milagre da santidade

SÃO PAULO - As relações entre ciência e religião são uma coisa complicada. Na comparação com outros credos e denominações, a Igreja Católica até que não se sai tão mal. Apesar do que fizeram com Galileu e outros cientistas, os católicos têm pontos a seu favor. Criaram as universidades e, através de algumas ordens muito atuantes na educação, ajudaram a disseminar o saber.

É meio estranho, portanto, o mau uso que a igreja faz da ciência nos processos de canonização, como o que acaba de erguer João 23 e João Paulo 2º à condição de santos.

O Vaticano afirma valer-se de critérios rígidos para certificar os milagres atribuídos aos candidatos. São utilizadas até comissões de médicos e cientistas que atestem que o fenômeno em questão não tem explicação natural. É aí que o bicho pega.

Numa definição forte, só seriam milagrosos os eventos que contrariassem leis naturais. Coisas como parar a rotação da Terra. Mas a própria igreja diz que esse gênero de milagre é raro. Menos incomuns seriam aqueles nos quais nenhuma lei da natureza é negada, mas que não deveriam ocorrer naquele caso preciso. É aí que entram as curas inexplicáveis, muito usadas nas canonizações.

O problema da igreja é que, ao apoiar-se na ciência para certificar que um milagre ocorreu, ela nega uma das principais características do método científico, que é jamais proclamar verdades eternas. Em ciência, tudo é necessariamente provisório. E isso deixa a santidade perigosamente à mercê do avanço tecnológico.

No século 18, quando o grosso das atuais regras de canonização começou a valer, uma máquina voadora seria tomada como indício inequívoco de milagre. Mas basta entrar num aeroporto moderno para constatar que o voo humano se tornou rotina. De modo análogo, a cura misteriosa de hoje talvez possa ser facilmente explicada amanhã. Será que, neste caso, a igreja teria de cassar o título hagiológico de alguns santos?


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