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Leandro Tessler

TENDÊNCIAS/DEBATES

A USP deveria cobrar mensalidades dos alunos?

sim

Uma questão de princípio

Não demorou muito para a Folha sugerir que a cobrança de mensalidades pode ser uma solução para a crise financeira da USP (e por tabela das demais universidades estaduais paulistas). Segundo o jornal, pelo menos 60% dos estudantes poderiam pagar mensalidades. A universidade poderia arrecadar 44% do repasses do governo a partir desse modelo. O assunto é delicado e exige uma reflexão mais profunda.

Nunca vou esquecer a expressão de espanto que vi no rosto de uma alta autoridade da educação superior brasileira quando soube que nos Estados Unidos e na maior parte da Europa o ensino superior público é pago. Os brasileiros acostumaram-se a pensar que ensino público é sinônimo de gratuito. Não é.

O raciocínio que sustenta a gratuidade do ensino superior público brasileiro envolve duas premissas: (1) o Estado deve prover educação gratuita em todos os níveis para garantir o acesso equitativo, inclusive de quem não tem condições financeiras e (2) a sociedade deve arcar com esses custos para garantir a formação de profissionais competentes que devolverão o investimento ao longo de sua atuação profissional.

O modelo de financiamento da universidade pública brasileira, em particular das estaduais paulistas, onde temos uma parcela fixa da arrecadação, é único no mundo. Ao contrário dos poucos demais países onde o ensino superior público é gratuito, aqui o ingresso é sujeito ao sucesso numa bateria de testes escritos para garantir "acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um".

A citação é da Constituição de 1988. O processo resulta num dos mais perversos mecanismos de transferência de renda das classes mais pobres para as mais abastadas no mundo. Como o Estado não é capaz de prover educação fundamental pública de qualidade similar à privada (por quê?), a maior parte das vagas no ensino superior público e gratuito é ocupada por egressos de escolas privadas cujas mensalidades podem custar mais do que nas instituições de ensino superior.

Segundo estudo recente do Banco Mundial, cada ano passado numa instituição de ensino superior resulta no Brasil em um bônus salarial médio de 12%. Esse é o maior valor entre os países estudados. É correto que o Estado seja o financiador exclusivo das vantagens que a universidade proporciona ao indivíduo?

Nas melhores universidades públicas do mundo, os estudantes pagam para estudar. No entanto, o volume do pagamento das mensalidades (a palavra em português para isso é propina, apesar da conotação que ela tem na variante brasileira da língua) raramente ultrapassa 30% do orçamento.

Não é possível financiar pesquisa e desenvolvimento de ponta apenas com propinas, como bem demonstra o modelo de ensino superior privado brasileiro. O Estado não pode se isentar de sua responsabilidade com o financiamento do desenvolvimento, da inovação e da inclusão, sob pena de as instituições tornarem-se meramente centros de ensino onde não se faz pesquisa de ponta, fundamental para o desenvolvimento da sociedade.

Alunos que financiam ainda que parcialmente sua educação têm em média um maior comprometimento com o aprendizado. Eles sabem que o eventual fracasso numa ou noutra disciplina terá consequências financeiras, maiores que simplesmente uma nova matrícula. Isso muda sua relação com a instituição.

Sempre pode-se argumentar que cobrar propinas excluiria quem não tem condições de pagá-las. O sucesso do Prouni está aí para provar o contrário. Com bons mecanismos de assistência social, é possível garantir que nenhum talento seria desperdiçado. É uma questão de princípio.


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