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Nessa cauda de cometa
A suave aterrissagem do módulo espacial Philae no cometa Churyumov-Gerasimenko mesmerizou o planeta na última quarta-feira (12). Numa inédita manobra que durou sete horas, o veículo se desprendeu da nave-mãe, Rosetta, e caiu lentamente, até se fixar no astro.
A tarefa era das mais difíceis. Os comandos da aproximação final estavam todos programados --a distância de 511 milhões de quilômetros entre o corpo celeste e a Terra inviabilizava qualquer intervenção humana de última hora.
Sem propulsores para guiá-lo, o módulo dependia, para pousar, exclusivamente da fraquíssima gravidade do cometa, algo como um centésimo de milésimo da terrestre.
Além disso, a operação toda, iniciada com o lançamento de um foguete em 2004, desenrolou-se em torno de um objeto irregular, pequeno (meros 4 km de diâmetro) e que viaja à impensável velocidade de 135 mil km/hora.
Tinha muito para dar errado --e deu certo. Philae tornou-se o primeiro artefato humano a alcançar um tipo de corpo celeste que desde a Antiguidade fascina.
O local da aterrissagem, entretanto, não foi dos mais propícios. Bastante acidentado, não recebe radiação solar suficiente para alimentar as baterias do veículo. Sem energia, o módulo acabou entrando em um período de hibernação.
O contratempo, ainda assim, em nada diminui o sucesso e os objetivos da missão --que ainda conta com a sonda orbitadora Rosetta. Segundo os cientistas do projeto, Philae, no pouco tempo que teve, cumpriu todos os objetivos programados.
Há uma série de mistérios cosmológicos que podem ser desvendados a partir daí. Espera-se que cometas ajudem a compreender melhor a formação da Terra e do Sistema Solar. Seu estudo também pode lançar luz sobre a origem da água em nosso planeta, elemento indispensável à vida.
A origem da própria vida, aliás, pode estar associada a esses astros, ricos em compostos orgânicos. Não se descarta que uma colisão remota tenha trazido tais moléculas para nosso planeta.
Tais conjecturas serão postas à prova pela missão, preparada para analisar o solo do cometa e perscrutar seu comportamento à medida que se aproxima do Sol.
Os objetivos da ESA (Agência Espacial Europeia) não são modestos. O próprio nome da sonda que levou o módulo, ao homenagear a Pedra de Roseta, que permitiu a decifração dos hieróglifos egípcios, carrega a ambição do projeto: decifrar como se formou esse pedaço recôndito da Via Láctea.