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Sem solução à vista

Maior empecilho para enfrentar a questão do crack é a ilusão de que haja saída fácil ou simples para o drama da dependência química

Um dos piores encargos do governante é ter de enfrentar os problemas sem solução, fonte permanente de prejuízos eleitorais.

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), secundado pelo prefeito Gilberto Kassab (PSD), identificou um desses flancos na cracolândia. A região no centro da capital paulista foi tomada há anos por usuários da droga devastadora do crack.

Sucessivas administrações nos governos do Estado e do município prostraram-se diante desse desafio à segurança e à saúde públicas. Na iminência do lançamento de um programa federal que poderia municiar o PT na campanha eleitoral para a prefeitura paulistana, Alckmin e Kassab se viram compelidos a agir.

A operação iniciada há 17 dias pecou pela ênfase na repressão. A Polícia Militar é mais fácil de mobilizar que de controlar, pois se pauta pela lógica do confronto.

Com a reação negativa do público diante da violência e da gratuidade das medidas repressivas -como forçar os "noias" a dar voltas no quarteirão-, o governo estadual recuou. Suspendeu o emprego de meios excessivos, como balas de borracha. Depois, anunciou que vai duplicar as vagas para dependentes químicos no sistema de saúde do Estado. Uma admissão clara de que a ação precipitada deixou em segundo plano o componente da assistência social e sanitária, crucial para que a operação não resulte apenas cosmética.

O debate sobre a eficácia da iniciativa quase se desencaminhou, em certa altura, ao centrar-se na dicotomia entre repressão associada com internações forçadas, de um lado, e abordagem por agentes sociais baseada no respeito aos direitos do dependente e na construção de relações de confiança, de outro. Em realidade, todas as modalidades podem ser necessárias.

Traficantes têm de ser presos e julgados. A polícia tampouco pode tolerar que nesta ou naquela rua se fume crack à vista de todos.

Assistentes sociais e profissionais de saúde devem oferecer continuamente o tratamento fora das ruas para poder resgatar aqueles que já não sejam irrevogavelmente refratários. Para os casos extremos ou irrecuperáveis, a lei já faculta a internação involuntária por parentes, médicos ou juízes -em situações específicas e excepcionais, como deve ser.

Acima de tudo, é preciso ter clareza de que o flagelo do crack pode ser contido em uma área específica como a cracolândia, e talvez até eliminado, mas também de que isso não é trabalho para dias nem semanas, e sim meses ou anos.

Sempre haverá dependentes químicos. Enfrentar o problema exige ações consistentes e perenes, não operações eleitoreiras movidas pela miragem de soluções definitivas.

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