EDITORIAIS
Realidade indisciplinada
A diretora de uma creche paulistana apenas questionou um pai sobre a razão de seu filho não ter frequentado a instituição em janeiro. O genitor, afinal, dissera que necessitava do atendimento à criança naquele mês, quando a instituição funcionaria excepcionalmente.
Seguiu-se uma resposta absurda e covarde: socos e agarrões. O caso, relatado nesta Folha na quinta-feira (5), se junta a outras lamentáveis ocorrências de agressões a profissionais da educação no país.
Episódicos, os eventos de violência são uma consequência extrema de outra situação, mais generalizada: a falta de reconhecimento.
Tal sentimento, ao lado da baixa valorização salarial, configura uma das principais insatisfações dos docentes brasileiros, segundo pesquisa da Fundação Lemann com base em entrevistas de mil professores do ensino fundamental 1 e 2 da rede pública nacional.
Os educadores, ademais, consideram-se pouco representados no atual debate educacional. A maioria dos professores (54%) ouvidos afirma, por exemplo, que não teve a oportunidade de contribuir antes da implementação de programas na escola em que leciona.
Outro aspecto que chama a atenção na pesquisa é o destaque da indisciplina em sala de aula como um dos temas que necessitam ser enfrentados com maior urgência.
Difíceis de avaliar, as causas do mau comportamento vão desde um reflexo de problemas em casa até o conteúdo das disciplinas escolares, em geral pouco atrativo e distanciado da realidade discente.
Os professores, por outro lado, não são formados para a dura rotina da sala de aula. Descobrem a dificuldade de lidar com turmas grandes e heterogêneas apenas durante o exercício da função; sem apoio, são obrigados a enfrentar sozinhos o alunato rebelde.
O tamanho do prejuízo em termos de tempo desperdiçado em sala de aula foi quantificado por outro estudo, este da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
Num universo de 34 países, o Brasil figura como aquele em que os professores gastam mais tempo para acomodar suas classes. São 48 minutos, ou 20% da duração de uma aula; a média internacional é de 13%. É um tempo que decerto poderia ser mais bem utilizado.
Enfrentar tais questões depende de um concerto de governos de todos os níveis e, sobretudo, da disposição dos promotores das políticas educacionais de olhar com mais atenção para o que se passa dentro da sala de aula.