Ruy Castro
Sem parentesco
RIO DE JANEIRO - Se você for um estudioso da música popular do século 20, será mais fácil se seu objeto for a música americana, francesa ou italiana. Os nomes são únicos, não há confusão. Veja a americana: só há um Armstrong, um Crosby, um Sinatra. Raríssimo o caso dos Gershwin, George e Ira, não por acaso irmãos. O mesmo quanto à música francesa: só há um Trenet (Charles), uma Piaf (Edith), um Montand (Yves). Ou a italiana: um Caruso (Enrico), um Gigli (Beniamino), um Di Stefano (Giuseppe).
Mas ponha-se na pele de um gringo que venha estudar a música brasileira. Exceto os Caymmi, em si uma escola, a barafunda é total. Tome os Alves, por exemplo: Ataulpho, Carmelia, Francisco, Gilberto, Lucio. Todos grandes, todos importantes e sem relação de parentesco --o que nosso amigo levará algum tempo para descobrir. O mesmo quanto aos Costa: Alayde, Carmen, Gal, Heleninha, Suely e Yamandu.
E os Barbosa? Começaram cedo, com Domingos Caldas, o pioneiro da modinha; continuaram com Orestes, o introdutor do telefone, do elevador e do arranha-céu nas letras das valsas e canções; chegaram a Luiz, que apresentou o chapéu de palhinha ao samba; seguiram com Castro, que gravou "Teu Cabelo Não Nega"; prosseguiram com Haroldo, um legítimo coringa da canção --fazia de tudo e bem; e culminaram em Adoniran, que, malandro, preferiu ser Barbosa a Rubinato.
Mas o grande problema estará nos Silva. Vide Abel, Anisio, Astor, Bezerra, Erasmo, Ismael, Moreira, Orlando, Patapio, Roberto, Romeu, Synval e Walfrido. Se alguns ou muitos deles não lhe forem familiares, vá por mim: cada qual na sua especialidade --cantores, compositores, instrumentistas--, o Brasil lhes deve tudo.
Não, Cyro e Doris Monteiro não são irmãos. Nem Claudette e Elza Soares. E muito menos Antonio e Angela Maria.