Mendonça Filho
TENDÊNCIAS/DEBATES
Quinze anos, mas sem festa
O PT ignorou a importância da Lei de Responsabilidade Fiscal, descumprindo-a e impondo um enorme rombo às contas públicas do país
Certas datas merecem comemoração. Por ser o diploma que impôs disciplina fiscal ao setor público, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) mereceria uma festa ao completar 15 anos nesta segunda-feira (4). Mas não há motivos para comemorar.
O PT, que diz governar o Brasil desde 2003, ignorou a importância dessa lei, descumprindo-a e impondo um enorme rombo às contas públicas do país. Há motivos de preocupação, especialmente diante das ameaças de retrocesso com as quais o país tem se deparado.
Não há como dissociar a LRF da concepção do Plano Real, idealizado sob supervisão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. O principal mérito do plano foi dissipar a hiperinflação. Lançado em 1994, um de seus pilares era a responsabilidade fiscal. O controle do gasto e dos níveis de endividamento se constitui em condição para a estabilidade e o crescimento do país.
Responsabilidade e austeridade devem ser o objetivo de qualquer que seja o governo. A LRF transmite a todos os agentes econômicos a imagem de um país comprometido com a sustentabilidade do gasto e com a capacidade de pagamento do Estado. São muitos os frutos dessa escolha: confiança, juros menores, inflação controlada e crescimento.
O governo Dilma tem colocado à prova esse compromisso com o país. Exemplo foi o que ocorreu com as contas públicas em 2014, ano eleitoral. Definiu-se uma meta de superavit primário de R$ 99 bilhões para o setor público. O ano terminou com deficit de R$ 32,5 bilhões, uma "virada" de mais de R$ 130 bilhões.
Considerados os pagamentos de juros (conceito nominal) em 2014, o deficit do setor público passou dos R$ 340 bilhões, 6,7% do PIB (Produto Interno Bruto). Números assim indicam o quanto o Tesouro Nacional paga para rolar a dívida. Nossos juros reais são superiores a 6% ao ano, enquanto é comum ver taxas negativas em outros países.
Esses indicadores revelam o tamanho da irresponsabilidade e do descontrole dos gastos públicos. São despesas crescendo bem mais que as receitas, com o aumento concentrado no custeio, enquanto o investimento não cresce. É apenas um lado da irresponsabilidade fiscal deste governo. Há também a questão da maquiagem dos números, com evidente desrespeito às leis.
Os truques contábeis caracterizaram a gestão de Guido Mantega à frente do Ministério da Fazenda. Ele e seu auxiliar Arno Augustin, secretário nacional do Tesouro, notabilizaram-se como alquimistas das contas públicas.
Para serem cumpridas, as metas fiscais dependiam de mágicas e "pedaladas", a ponto de analistas fazerem cálculos paralelos para ter noção exata da deterioração dos números. A chamada contabilidade criativa tem um preço: menos credibilidade e mais insegurança.
As manobras criativas foram classificadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) como ilegais, no caso específico da relação do Tesouro com os bancos oficiais, prática que feriu o artigo 36 da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Entendeu o TCU, por unanimidade, que, ao atrasar os repasses obrigatórios de programas de responsabilidade da União, o governo federal se financiou junto a entes sob seu controle. A intenção foi esconder o péssimo estado das contas públicas do país.
Em meio à apuração do crime de responsabilidade, integrantes do governo se eximem de culpa, sob o argumento de que as "pedaladas fiscais" são cometidas há anos. É como se a repetição do crime dirimisse a ilegalidade.
É importante registrar que a acusação de que outros governos teriam praticado idêntica ilicitude carece de comprovação.
Ao se valer de justificativa tão cínica, percebe-se a falta de compromisso com a responsabilidade fiscal. Vale comemorar os 15 anos da lei, estando em alerta para que as conquistas sejam mantidas.