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Sem ilusão
Crise econômica e política tornou o caminho do ajuste mais acidentado; governo deve fixar meta factível e persegui-la com rigor
O objetivo de economizar R$ 66 bilhões (1,1% do PIB) nas contas públicas (antes do pagamento de juros) neste ano está cada vez mais distante. Queda de arrecadação, dificuldades para aprovar medidas no Congresso Nacional e compromissos financeiros do passado tornaram o caminho do ajuste bem mais acidentado que o previsto.
Tem-se, na coleta de impostos, o pior desempenho em muito tempo. Até junho, houve retração real (descontada a inflação) de 2,9%, resultado direto da paralisia quase generalizada da atividade econômica. Já se projeta um encolhimento do PIB da ordem de 2%, sem que se descarte a continuidade desse quadro recessivo em 2016.
Os atritos ente o Executivo e o Legislativo também minam a confiança no ajuste. As medidas aprovadas tiveram seu alcance –e seu potencial de arrecadação– reduzido pelos congressistas, e a mais importante delas, o fim da desoneração da folha de pagamento, deve produzir efeitos somente a partir do ano que vem.
A administração da presidente Dilma Rousseff (PT) tenta acelerar a venda de ativos e as concessões de infraestrutura, mas será um processo lento. Como resultado, a poupança federal no primeiro semestre ficou perto de zero.
O desafio, agora, é revisar as metas de superavit sem comprometer a credibilidade do ajuste. Quanto a isso, há divergências no governo.
Como sustentou em entrevista a esta Folha, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, prefere perseguir o objetivo inicial. Receia, com razão, que a mudança venha a passar a imagem equivocada de que o ajuste está concluído, quando a verdade seria justamente o oposto.
Seu colega Nelson Barbosa (Planejamento), por outro lado, defende a adoção de um intervalo para a meta, no intuito de acomodar oscilações da economia. Em momentos de maior dificuldade, o saldo ficaria no piso estabelecido.
Na teoria, seria mais aconselhável buscar um sacrifício maior, a fim de abreviar sua duração; na prática, revelou-se ilusória a pretensão de economizar 1,1% do PIB. À luz da baixa credibilidade do governo, porém, um regime como o sugerido por Barbosa faria pouco para resgatar a confiança de investidores.
O melhor, assim, é fixar uma meta realista para 2015 –talvez próxima a 0,6% do PIB– e cumpri-la. Deve-se, ademais, manter o objetivo de poupar nos anos vindouros.
De resto, caso não se promovam reformas para limitar a expansão dos gastos públicos, será impossível equilibrar o orçamento sem progressivo aumento de impostos.
O país não escapará de escolhas difíceis nos próximos anos. As despesas obrigatórias, entre as quais estão as da Previdência, sobem 0,4% do PIB ao ano de forma automática –ou seja, ao final do atual mandato presidencial, estarão 1,6% acima do nível de 2014.
Considerando a necessidade de elevar o saldo primário do patamar atual de zero para 2,5% do PIB só para estabilizar a dívida, o ajuste requerido nas contas monta a 4% do PIB. Eis o tamanho do desafio.