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Hora da Justiça

É provável que em qualquer parte do mundo fosse capaz de despertar interesse geral um julgamento como o de Lindemberg Fernandes Alves, que confessou durante o júri ter matado sua namorada de 15 anos, Eloá Pimentel, depois de tê-la mantido por cerca de cem horas em cativeiro, em 2008, num apartamento de Santo André (região metropolitana de São Paulo).

O fato de a vítima ser tão jovem, além de terem sido passionais os motivos do crime, também conta. O mais importante, talvez, resida na ideia de que, estendendo-se por tão longo e tenso período, a situação poderia ter-se resolvido sem que prevalecesse o desfecho fatal.

Seria evitável o crime, escreve na Folha a juíza Rosana Navega Chaves, que julgou outro caso dramático, o do sequestro de um ônibus no Rio de Janeiro, em 2007. Na ocasião, a polícia recusou a proposta de que um líder religioso participasse de negociações com o criminoso. Intervenção semelhante, diz a juíza, poderia ter sido tentada no caso agora em pauta.

Difícil saber, claro, o que teria acontecido. Assassinada Eloá, quem quer que tenha acompanhado o drama não deseja, no momento, senão que se faça justiça.

Nesse sentido, ao que há de universal no interesse pelo julgamento se somam outras razões, típicas da conjuntura brasileira, para explicar o destaque dado ao episódio.

Uma notável carência de justiça percorre o cotidiano do cidadão; a convivência com a impunidade, que praticamente se ostenta, entre sorrisos, no ambiente político, é sua face mais visível. Num plano mais profundo, é uma sensação de desamparo geral que parece pulsar, de forma indignada ou vingativa, quando, por fim, algum criminoso se vê levado a responder pelo que fez.

O aparato de um tribunal do júri produz, assim, efeito ambíguo. De um lado, o cidadão encontra meios de se familiarizar com uma estrutura institucional capaz de transcender, pelo argumento e pela praxe jurídica, o que há de instintivo no puro ato de retaliação.

Todavia o que certamente existe de teatral no sistema torna-o permeável a um emocionalismo que nada contribui para a equilibrada administração da Justiça; ainda mais quando, em casos de alto impacto popular, a solidariedade com as vítimas se intensifica.

Falhas evidentes já se verificaram em julgamentos desse tipo; se a confissão de Lindemberg afasta tal risco, é crônica a incerteza a derivar dos tribunais do júri num país onde a sede de justiça tão raras vezes se aplaca e as penas em aparência rigorosas nunca se cumprem.

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