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Epopeia sem fim

Pacote imposto à Grécia para resolver crise da dívida pública tem poucas chances de dar certo; abandono do euro não pode ser descartado

Depois de frenética atividade nas últimas três semanas, concluiu-se finalmente o acordo que evita um calote imediato da Grécia. Longe de um desfecho para o drama, trata-se de um epílogo precário, com escassa chance de sucesso.

Além das hipóteses otimistas irreais que sustentam o programa -a começar da esperada estabilização do PIB em 2013-, a imposição de novas medidas de austeridade ameaça o já frágil equilíbrio político. Tampouco parece palatável, para a exaurida população que votará nas eleições legislativas previstas para abril, a inédita perda de soberania com o compromisso -inscrito na própria Constituição- de prioridade para o pagamento de juros da dívida pública.

O acordo imposto à Grécia se apoia sobre três esteios para reduzir sua dívida de 160% para 120% do PIB em 2020. O primeiro é o desconto de quase 75% no valor da dívida em mãos de credores privados (€ 100 bilhões de alívio). Em paralelo, haverá financiamento adicional de € 130 bilhões pela União Europeia, em troca de medidas drásticas de austeridade.

Os cortes nos dispêndios governamentais, por fim, têm como meta levar o resultado primário das contas públicas (saldo antes das despesas com juros) de um deficit de 2,4% do PIB em 2011 para um superavit permanente de 4,5% do PIB a partir de 2014.

Nada disso será fácil. O potencial para acidentes de percurso é enorme, a começar pelo risco de distúrbios civis cada vez mais violentos. O FMI estima que mesmo um crescimento negativo moderado já inviabilizaria o ajuste.

Muitos indagam abertamente se não seria mais conveniente para a Grécia dar o calote agora e abandonar o euro. A restauração da competitividade da economia poderia então ocorrer por meio da desvalorização da nova moeda, em lugar da compressão dos salários, para baratear os produtos e serviços gregos no mercado mundial.

Mas é inegável que as autoridades gregas ainda não estão dispostas a bancar essa aposta arriscada. A ruptura financeira é o temor principal. Uma saída da zona do euro causaria perda patrimonial maciça para todo o setor privado, incluindo as famílias, que teriam de converter ativos e passivos em moeda desconhecida.

Uma solução intermediária a ser considerada é a saída temporária da zona do euro, isto é, realizar um ajuste consentido que, de algum modo, evite o colapso financeiro geral e permita à Grécia retomar o crescimento com maior flexibilidade. Parece algo irrealista, mas há exemplos bem-sucedidos de mudança ordeira na denominação de contratos -um deles é a URV, que precedeu o Plano Real.

Seja como for, exigir da Grécia mais dez anos de estagnação e empobrecimento, além de inviável politicamente, é socialmente cruel. Abandonar a zona do euro sem planejamento tampouco seria trivial. Estreita-se a olhos vistos o espaço para encontrar soluções alternativas, a tempo de evitar o desenlace trágico de uma convulsão social.

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