Fábio Seixas

Tristes folhas

RIO DE JANEIRO - Eram as 16 folhas de papel mais tristes de Ipanema. Estavam, até outro dia, fixadas com durex na janela da sala daquele apartamento de primeiro andar.

As oito primeiras, uma letra por folha, diziam: "Aluga-se". Na linha de baixo, oito números. Um telefone.

Para quem conhece a história, tristíssimas 16 folhas.

Atrás daquela janela morava Maria Eduarda, 12, morta no acidente com o bondinho de Santa Teresa. Nos encontros fugazes no elevador ou na garagem, um encanto, sempre esperta, vivíssima.

A família se mudou de lá. Continua na mesma rua, mas em outro prédio. Buscou novos ares. Aquele apartamento provavelmente trazia recordações para além do suportável.

Foi posto para aluguel. Na semana passada, a janela estava limpa.

As 16 folhas eram o que se pode chamar de "pós-notícia". A tragédia acontece, a imprensa a cobre intensamente e, um dia, o assunto some. Mas as pessoas continuam vivendo, as vítimas seguem sofrendo, as consequências não param.

Ocorre que outras notícias se sobrepõem. E, de lá para cá, o serviço de transportes do Rio foi pródigo em gerá-las. No mau sentido.

Em novembro, as gôndolas do teleférico do Alemão pararam, gerando pânico em passageiros. Dias depois, um acidente com uma barca vinda de Niterói deixou 55 feridos.

Em dezembro, a viagem inaugural de um dos trens "modernizados" da Supervia ganhou ares de pastelão, com ar-condicionado pifado, luzes piscando e goteiras no vagão.

No último dia 9, os subúrbios ganharam ares de Índia, com usuários empoleirados num trem para a Central do Brasil. Houve quebra-quebra, promovido não por baderneiros profissionais, mas por trabalhadores sem paciência com falhas diárias.

Muito problema para pouco tempo. Hoje a tragédia de Santa Teresa completa seis meses.