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Hélio Schwartsman

Leis e essências

SÃO PAULO - Para que servem as regras? Tomemos um caso concreto. Na quarta-feira passada, os ministros do Supremo decidiram que a criação do Instituto Chico Mendes, em 2007, tinha um vício de origem (foi aprovado por medida provisória que não passou por todas as comissões necessárias), sendo, portanto, inconstitucional e inválida.

Na quinta-feira, quando os indômitos magistrados se deram conta de que idêntico raciocínio aplicava-se a centenas de leis originadas a partir de MPs, que também correriam risco de ser declaradas nulas, mudaram o alcance da decisão, afirmando que ela só vale para casos futuros.

Do jeito que fez, o STF deu a impressão de que trata os assuntos que lhe são submetidos com uma certa leviandade, mas é difícil sustentar que os ministros poderiam ter agido de outra forma. A instabilidade jurídica que se seguiria seria excessiva até para os padrões brasileiros.

As MPs são fichinha perto de um outro caso já quase esquecido. Em 2003, o ex-parlamentar e ex-ministro do STF e de várias pastas em diversos governos, Nelson Jobim, em uma de suas inconfidências, revelou que a Comissão de Redação da Constituinte introduziu na Carta de 1988, com o aval de lideranças partidárias, dispositivos que não haviam sido aprovados em dois turnos no plenário, como mandava o figurino.

É um belo de um vício de origem, uma fraude até. Mas teria sido inconsequente anular no todo ou em parte a Constituição por causa da esperteza dos caciques políticos de então.

É claro que não podemos desprezar ritos e regras de procedimento, que, em geral, existem por boas razões, mas não faz sentido tentar corrigir erros do passado abraçando fardos desproporcionais. Leis, em especial as que regem o funcionamento da sociedade, não existem para expressar essências mágicas das instituições, mas para facilitar as nossas vidas. Acreditar demais em essências é a marca do pensamento conservador.

helio@uol.com.br

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