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Joel Pinheiro da Fonseca

O assunto é racismo

O racismo como desculpa

O movimento negro monopoliza o debate e mina a autocrítica; não se diz, por exemplo, que só 36% dos negros dos EUA crescem com ambos os pais (76% dos brancos)

Uma das conquistas inegáveis de nosso tempo é a proscrição, pela opinião pública, do racismo. A defesa do racismo aberto, franco, acabou; quando muito, tem de vir matizada e disfarçada sob outras roupagens -econômicas, culturais etc.

Só que essa conquista, como tudo na vida, teve um preço: a reação ao racismo, ao preconceito e à desigualdade em geral atribui a eles mais poder do que merecem.

Seja nos EUA ou no Brasil, os movimentos "negros" (a ideia de atribuir um pensamento a uma raça já é altamente questionável) monopolizam os termos em que se dá o debate sobre a desigualdade.

Os negros estão sub-representados em faculdades e empresas? (De fato, estão.) Então a única solução é corrigir essa injustiça via ações afirmativas no resultado final. Ser contrário a isso é ser contra os negros.

Se a universidade não espelha a demografia geral do país, procuremos as causas e, se entre elas encontrarmos injustiças, descubramos como melhor vencê-las.

Dessa maneira, o resultado final será corrigido organicamente, sem arremedos. Caso contrário, levando em conta que judeus e mulheres estão super-representados nas universidades, deveríamos dar cotas a homens e a não judeus?

Nos EUA, por exemplo, pouco se leva em conta que apenas 36% das crianças negras crescem com ambos os pais (entre as crianças brancas, 76%; entre as asiáticas, 82%).

É um grave problema social e tem piorado nas últimas décadas. O racismo não explica tudo.

Walter Williams, economista americano da George Mason University (e negro; é uma pena que este dado importe no debate, mas importa), tem se dedicado a apontar fatores internos à comunidade negra que atrasam seu progresso.

Um das fatores apontados por ele é "ebonics", dialeto negro -que, garante Williams, não era falado quando ele era jovem, nos anos 1940 e 1950. O efeito do dialeto é isolar os negros social e linguisticamente.

O resultado é que, embora os negros como um todo tenham melhorado de vida, os negros pobres estão pior: mais crime, mais drogas, mais desemprego.

No caso do Brasil, é tolo perguntar se há racismo. É claro que há. Mais interessante é indagar qual racismo é esse.

O ódio racial a la Ku Klux Klan é inexpressivo. O nojo racial também não é preponderante, vide o grau de miscigenação, casamentos mistos e apreciação geral das belezas negra e mulata. Há, contudo, o racismo da condescendência, de ver o negro como mais selvagem, mais bruto e menos capaz intelectualmente.

O discurso dos movimentos raciais confirma, implicitamente, a tese preconceituosa da incapacidade do negro, que precisaria de ajuda externa para ascender.

Ao mesmo tempo, mina o esforço de melhora individual e de autocrítica, ao atribuir tudo o que dá errado a um sistema perverso e invencível, algo que gera um ciclo de dependência vicioso.

Veja: os judeus não ascenderam na Europa antissemita por meio da ação afirmativa ou do discurso racial. Sua resposta à injustiça foi oposta: desenvolveram uma cultura de excelência. O resultado, hoje, mede-se em prêmios Nobel.

Da mesma forma, na luta contra o machismo, o bem que uma cientista, empresária ou política bem-sucedida faz para a imagem das mulheres (sem falar para si própria) em muito supera o de incontáveis dissertações sobre o patriarcado. É a diferença entre exigir e conquistar.

Não se trata de competir para saber quem foi mais historicamente injustiçado nem de negar a realidade da injustiça. Trata-se, isso sim, de identificar diferentes respostas a obstáculos e as implicações individuais e culturais que elas acarretam.

Uma vez garantidos os direitos iguais, o exemplo fala mais alto que lamúrias e coação. Os direitos são iguais. Que não se permita que a raça, objeto de preconceito, transforme-se em desculpa de fracasso.

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