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Berenice Giannella

TENDÊNCIAS/DEBATES

A nova lei federal para internos adolescentes

Poucos jovens terão visita íntima, e ela pode ajudá-los a criar laços, facilitando a recuperação. Filhos também poderão visitar os internos

Em artigo no dia 30 de abril ("Na Febem, maior para efeitos sexuais"), o advogado Ari Friedenbach usa como pretexto a promulgação da lei federal 12.594/2012 para fazer críticas injustas e equivocadas ao sistema socioeducativo paulista.

O texto deixa a entender, citando o meu nome, que a aprovação da visita íntima vai permitir um "laissez-faire" nos centros socioeducativos da Fundação Casa.

Para que não exista qualquer possibilidade de interpretações errôneas, deixemos claro que a visita íntima está prevista em lei aprovada pelo Congresso e sancionada pela presidente da República. E que permite o direito apenas a jovens casados ou em união estável comprovada.

Em São Paulo, dados tais requisitos, teremos poucos adolescentes com direito à visita íntima. Portanto, a situação é muito distante da descrita pelo senhor Friedenbach, para quem o Estado está dando aos jovens um "lazer descabido" e patrocinando gestações indevidas.

Postos tais esclarecimentos, é imperativo explicar do que trata a referida lei -aprovada não apenas para criar a visita íntima, mas para formatar o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), regulando as condições em que serão executadas as medidas aplicadas pelo Poder Judiciário a adolescentes autores de atos infracionais.

O Sinase traz avanços cuja análise detalhada este espaço não comporta. Alguns exemplos: a nova lei amplia o direito à defesa dos adolescentes nos processos judiciais, estipula normas para o bom funcionamento das unidades de internação e da liberdade assistida e reforça ações que visam a educação e o encaminhamento dos adolescentes ao mercado de trabalho -tudo isso permeado pela exigência de um atendimento individualizado.

A maioria dos pontos previstos pelo Sinase em termos de qualidade de atendimento já é contemplada em São Paulo por meio da Fundação Casa, onde os adolescentes estudam, fazem cursos de educação profissional, têm atividades esportivas e culturais, atendimento por psicólogos e assistentes sociais, além de atenção integral à saúde.

Os avanços da Fundação Casa são conhecidos, como a queda na reincidência na medida socioeducativa de internação, que despencou de 29% em 2006 para 13,5% nos dias de hoje -isso sem falar na drástica redução no número de rebeliões.

Temos, portanto, um atendimento de referência, que serve de modelo para o restante do país, como observou o Conselho Nacional de Justiça em relatório recente.

Dentro do contexto Fundação Casa e da nova lei federal, a questão da visita íntima chega a ter, portanto, uma importância ínfima.

O intuito claro dos legisladores com a inclusão da visita íntima de esposas ou companheiras -e não de namoradas ou "ficantes"- foi garantir que os laços afetivos das famílias pudessem favorecer a recuperação dos jovens, muitos deles sem pais ou mães, que têm em sua companheira a única referência positiva em suas vidas.

O mesmo vale para os filhos, que agora também estão expressamente autorizados a visitar os pais que sejam adolescentes internos.

Claro que as visitas serão precedidas de toda uma orientação focada em saúde e em métodos contraceptivos, o que, aliás, a Fundação Casa já faz rotineiramente, considerando que estamos preparando cidadãos para o mundo. Mas igualmente claro está que apenas jovens que já tinham vida marital e familiar gozarão do benefício.

É verdade que a questão, extremamente polêmica, tende a levantar protestos. A nós, que dirigimos unidades socioeducativas, caberá o cumprimento da lei, o que sempre temos que fazer com respeito ao ser humano, dignidade, denodo e eficiência.

BERENICE GIANNELLA, mestre em direito pela USP, é presidente da Fundação Casa

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br

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