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Difícil de acreditar

Explicações de Demóstenes Torres a respeito de ligações com Cachoeira não o eximem da acusação de óbvia quebra do decoro parlamentar

Viesse de um parlamentar qualquer -desses que não se incomodam com barganhas fisiológicas nem se destacam pelo combate à corrupção-, ainda assim o depoimento seria capaz de suscitar desconforto e até repulsa.

Foram mais do que isso -orçando para o constrangedor- as declarações do senador Demóstenes Torres (ex-DEM-GO) ao Conselho de Ética do Senado, no processo que pode levar a sua cassação por quebra do decoro parlamentar.

Tratando-se de alguém que, até pouco tempo atrás, envergava a mais impenetrável couraça de respeitabilidade e manifestava invulgar tarimba na detecção de irregularidades na conduta alheia, é natural que se receba com rigor, e intenso ceticismo, alguns aspectos do seu pronunciamento.

É o caso das explicações de Demóstenes a respeito de uma ligação sua para Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, avisando-o de suposta operação policial. Mero teste, alegou o senador, para confirmar se Cachoeira havia de fato abandonado, como dizia, suas atividades ilegais.

Se Demóstenes mantinha esses laivos de desconfiança com as atividades de Cachoeira, o mais indicado, para não dizer o mais decoroso, teria sido evitar proximidade com o empresário suspeito.

Revelaram-se, todavia, inúmeros indícios de amistoso convívio. O senador recebeu do acusado de contravenção um rádio-telefone, em tese antigrampo, para facilitar a comunicação entre os dois. "Hoje é fácil verificar que foi um erro", argumentou Demóstenes. "Mas não é crime receber o rádio."

Tampouco foi crime pedir ao conhecido empresário que lhe comprasse vinhos avaliados em R$ 30 mil. Demóstenes disse não ter completado a transação -o negócio não seria tão bom quanto parecia.

A negativa não elimina o foco do problema: a amizade com Cachoeira incluía favores que, há algum tempo, o próprio senador seria o primeiro a denunciar de forma candente, se verificados no cotidiano de outro parlamentar.

Vinhos, presentes e telefones à parte, o Ministério Público Federal aponta que Demóstenes recebeu R$ 3,1 milhões do esquema Cachoeira. O senador nega.

O próximo passo na investigação desse ponto -a quebra do seu sigilo- foi agora aprovado na CPI do caso Cachoeira, que tomou também, finalmente, a iniciativa de convocar os governadores Marconi Perillo (PSDB-GO) e Agnelo Queiroz (PT-DF) para depoimento.

Embora tenha sido poupado o também governador Sérgio Cabral (PMDB-RJ), há pelo menos sinais de avanço na disposição de investigar. Demóstenes, noutros tempos, seria o primeiro a aplaudir.

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