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Alexandre Vidal Porto

O assunto é Parada Gay

Dilma, precisamos de sua voz

Posicionar-se publicamente pela igualdade, como fizeram outros líderes, seria decisivo. Veja que muitos gays ainda têm de desfilar disfarçados

Senhora presidenta, Se a senhora ligou a TV ontem, viu a Parada Gay de São Paulo.

Pode parecer festa. Mas é passeata. Parecerá que estamos dançando, mas essa dança é só uma maneira diferente de marchar. É o modo que encontramos para reivindicar direitos que todos os outros brasileiros, que não nasceram homossexuais, já têm. É a forma de dizermos: somos tão humanos e tão brasileiros quanto vocês.

Somos milhões de homens e mulheres. Mesmo que não nos enxerguem, fazemos parte da realidade. Estamos em todas as cidades e em todas as profissões.

Neste domingo, a senhora nos viu marchando. Nos outros dias do ano, porém, é mais fácil nos encontrar sendo ridicularizados em programas de televisão, barrados nos bancos de sangue, impossibilitados de casarmos com quem amamos ou espancados nesta mesma avenida em que, ontem, pedimos que o Brasil nos respeite e nos trate como iguais.

Nossa natureza é usada como xingamento. Gente eleita para nos proteger nos desqualifica. Religiosos nos apresentam como inferiores. Sofremos violência gratuita. Uma vida de rejeição e ridicularização enfraquece a autoestima, presidenta.

Note que alguns de nós desfilamos disfarçados. É para não sermos reconhecidos e nos tornarmos objeto de mais discriminação ainda quando a parada acaba e voltamos para o nosso dia a dia.

Já restauramos a democracia. Por que, então, nossos direitos constitucionais continuam ignorados? Por que seguem atacando nossa dignidade? Por que nossa liberdade é constantemente reprimida?

Às vezes parece que, no Brasil, a democracia ainda não chegou para os homossexuais. Nossa cidadania permanece incompleta.

Como brasileiros, merecemos mais respeito e mais proteção legal. O discurso virulento contra nossa natureza não pode ser descaracterizado como liberdade de expressão. Ódio e intolerância não são opinião. São crimes.

Nossas famílias têm de ser reconhecidas e tratadas com igualdade, não como anomalia. Nenhuma família é melhor ou mais moral que as outras.

Sabemos que as coisas estão mudando. Mas mudam muito lentamente. Poderiam mudar mais rápido. A vida de quem sofre discriminação é agora. Se a igualdade demorar muito para chegar, a vida passa.

Precisamos que a reforma do Código Penal tipifique a homofobia como crime. Precisamos que se estabeleça o casamento civil igualitário. Precisamos que se eduque a população sobre a diversidade humana. São tarefas difíceis, presidenta. Para realizá-las, seu apoio é decisivo.

Muitos líderes mundiais já se posicionaram publicamente em favor dos direitos de igualdade. Em seus países, isso fez diferença.

Os brasileiros homossexuais e os que com eles se solidarizam ficariam orgulhosos se nossa presidenta também emprestasse sua força para defender essa parcela de nossa população que segue sendo injustiçada. Pedimos direitos iguais, presidenta. Nem mais, nem menos. Para consegui-los, precisamos de sua voz.

ALEXANDRE VIDAL PORTO, 47, mestre em direito por Harvard, é diplomata e escritor, autor de "Matias na Cidade" (Record)

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