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Kenneth Maxwell

Jorge Amado

Este ano marca o centésimo aniversário de nascimento de Jorge Amado. O evento está sendo comemorado com diversas celebrações, muitas das quais promovidas pela Academia Brasileira de Letras, para a qual foi eleito em 1961.

Em 1951, o escritor havia recebido o Prêmio Stálin. Em 1956, Nikita Khruschov denunciou as atrocidades de Josef Stálin -por muito tempo líder da União Soviética- durante o 20º Congresso do Partido Comunista, em Moscou.

O discurso "secreto" de Khruschov não demorou a vazar. Causou grande consternação a muitos daqueles que se haviam deixado atrair pela promessa do comunismo, sobretudo os que viviam em sociedades de alta desigualdade, como o Brasil, e muito distantes das realidades da vida cotidiana na União Soviética.

A denúncia de Stálin por Khruschov causou choque especialmente forte a Amado, comunista desde os anos 30. Os livros dele haviam sido queimados em praça pública nos anos mais sombrios da ditadura Vargas. Foi preso por ser membro do Partido Comunista Brasileiro. Exilado na Argentina e no Uruguai, Amado publicou, em 1942, uma biografia do líder comunista brasileiro Luís Carlos Prestes, com um título otimista: "O Cavaleiro da Esperança".

Quando Khruschov mudou o nome do Prêmio Stálin para Prêmio Lênin, Amado escreveu, em 1957: "Fui stalinista de conduta irreprochável, subchefe da seita, se não bispo ao menos monsenhor; descobri o erro, custou trabalho e sofrimento, deixei a missa em meio, saí de mansinho. Nem por me haver dado conta e abandonado o redil escondi ou neguei ter recebido, em dia de glória, com honra e emoção inimagináveis, o Prêmio Internacional Stálin".

Amado deixou o Partido Comunista nos anos 50. Seus maiores sucessos comerciais como romancista viriam depois disso. Convidado a apoiar o protesto internacional do Pen Club contra o ataque ao romancista Salman Rushdie, ele não poupou palavras:

"Parece-me absurdo, inacreditável, inaceitável, que no fim do século 20 um escritor esteja encerrado em esconderijo, sob proteção da polícia, proscrito da sociedade, condenado à morte por uma seita no exercício da discriminação religiosa, pela inquisição xiita, com aval do governo do Irã. Nem um único escritor pode se manter indiferente a essa agressão sem medida ao direito de criar, à liberdade de pensamento e expressão. Aquele que não protestar, que não exigir que a ameaça de morte que pesa contra Salman Rushdie seja retirada, está faltando ao seu dever, o mais elementar. O direito de criar corre perigo, a própria existência da literatura está sob ameaça".

Jorge Amado não havia esquecido as lições da tirania de Stálin.

KENNETH MAXWELL escreve às quintas-feiras nesta coluna.

Tradução de PAULO MIGLIACCI

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