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Ruy Castro

Homem de amanhã

RIO DE JANEIRO - Você dirá que devo ter mais o que fazer. Durante o recente fuzuê armado pelos 60 anos de coroa da rainha Elizabeth 2ª, da Inglaterra, e que monopolizou o noticiário por vários dias, observei que seu filho, o príncipe Charles, estava sempre com a mesma roupa: um antiquado jaquetão cinza-claro, camisa branca e gravata listrada em azul e bordô -qualquer que fosse a situação.

Vendo aquilo, perguntei-me se Charles, tido por tantos como um dois de paus e que talvez seja passado para trás por seu próprio filho William na sucessão da rainha, não estaria com problemas financeiros. Com a crise na Europa, teriam reduzido sua dotação anual, o que o deixou sem capital para comprar ternos novos?

Por mais ridículo, meu interesse por Charles vem de longe. Temos a mesma idade e, enquanto ele foi acumulando títulos (príncipe de Gales, duque da Cornualha, cavaleiro da Ordem da Jarreteira, grão-mestre da Ordem do Banho etc.), eu preferi continuar plebeu. Crescemos, amadurecemos e envelhecemos ao mesmo tempo. Ele parece hoje em melhor forma do que eu, o que não é vantagem. Mas, nesses anos todos, sei que fui mais feliz. A tristeza de Charles é evidente -está em seu rosto.

Talvez porque ele seja um injustiçado. Poucos sabem que Charles é um ativista pioneiro na defesa do desenvolvimento sustentável, da energia renovável, da proteção às florestas, da agricultura orgânica, e põe dinheiro de seu bolso nessas causas -talvez por isso não sobre para ternos. É também um fiscal implacável da preservação arquitetônica em seu país. Não é bobo, nem lerdo, como se diz, mas um homem de grande valor. Um dia, todos pensarão assim.

Uma antiga loja de roupas para crianças no Rio se chamava Príncipe, e dizia: "Veste hoje o homem de amanhã". Se ainda existisse, Charles poderia se vestir nela.

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