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Marta Suplicy

É Fellini?

Não. É Woody Allen apresentando o povo italiano de forma felliniana, ao mesmo tempo em que introduz a internet e a mídia do século 21, que Fellini não viveu.

"Roma é um lugar muito vasto para caber em um único enredo. Uma cidade artística, que acontece a céu aberto", diz Woody Allen, que agrega os monumentos e vielas romanas como parte dos seus enredos.

O filme abre ao som de "Volare". Estamos na Itália!

No ponto, a construção do que seja "celebridade"! Andy Warhol já prognosticava que um dia todos teriam seus 15 minutos de fama.

O que o senhor come no café da manhã? Essa é a primeira pergunta a um homem sem nenhum atrativo, que, de tão questionado respeitosamente sobre babaquices, vai acreditando na sua importância.

Torna-se uma celebridade perseguida pelos jornalistas e prestigiado pelos organizadores de eventos.

Roberto Benigni dá um banho de interpretação. A sutileza com que vira a cabeça, como um ventilador, quando o interesse da mídia e do público o abandonam pelo novo alvo de consumo, transmite, com perfeição, cenas que presenciamos no cotidiano do nosso mundo político e artístico. É igualzinho.

Outro episódio é o da jovenzinha tímida do interior que chega a Roma para conhecer a importante família do marido. O tal se envolve com uma prostituta (a deslumbrante Penélope Cruz) e a linda mocinha, perdida em Roma na busca de um salão de cabeleireiro, é fisgada pelo impacto de conhecer, numa filmagem na rua, o seu ídolo.

Daí, para um almoço hilário e ir para um hotel é um passo. Pensativa, no banheiro, ela decide enfrentar o adultério: "Afinal, posso me arrepender a vida toda por perder tal oportunidade". Eis que surge um assaltante, mais a mulher do galã e, num rolo típico da melhor comédia pastelão, docemente constrangida, a mocinha decide que, afinal, todos tendo ido embora, menos o ladrão, ela não perderia a ocasião.

Neste episódio, um jovem ingênuo fica fascinado pela amiga da namorada. Bonitinha, parecendo ter engolido um grilo falante plugado no Google, entre batidas de pestanas e recitações de autores, ela seduz o mocinho e parte rapidamente à chamada de nova aventura.

História trivial não fosse Alec Baldwin funcionando no papel de superego invisível. Dá conselhos, alerta, tenta proteger. Magistralmente, Allen mostra como é obtusa e cega a cabeça de um apaixonado.

Temos também o cantor de óperas, infelizmente só bem cantadas quando embaixo do chuveiro. É um episódio divertido e surreal, quando Fellini volta forte e a Itália se funde ao gênio americano.

Woody Allen é um bom cicerone de cidades, povos, hábitos e costumes. Além de delicioso refresco para a alma.

MARTA SUPLICY escreve aos sábados nesta coluna.

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