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Editoriais O texto abaixo contém um Erramos, clique aqui para conferir a correção na versão eletrônica da Folha de S.Paulo. Alerta na Argentina Gestão populista e temerária da economia nos governos Kirchner desafia o Brasil, que tem 8% de suas exportações voltadas ao país vizinho A crise econômica que ajudou a esfarelar o apoio a Fernando Lugo no Paraguai produz estragos -uns mais graves, outros menos- em toda a região. A Argentina de Cristina Kirchner não foge à regra. Inflação alta (maquiada nos índices oficiais), episódios de desabastecimento, corrida para o dólar e fuga de divisas são alguns dos males crônicos do país vizinho novamente sensibilizados pela conjuntura. A contrabalançá-los, do lado positivo, está a herança benigna de um ciclo de excelente desempenho da atividade econômica. De 2003 a 2011, o PIB argentino cresceu à média anual de 7,7% -mais que o dobro da velocidade brasileira. A influência da alta no preço internacional dos produtos básicos (commodities) exportados foi um vetor de crescimento da renda ainda mais importante no caso argentino. No país vizinho, as exportações correspondem a cerca de 20% do PIB; no Brasil, a 10%. Causa primeira do boom dos emergentes na última década, a atividade na China se enfraquece, deprimindo a demanda pelas commodities e seus preços. Dependente desses produtos primários e da renda do comércio, a economia argentina expõe-se ao baque. O modo como se deu o crescimento acelerado da Argentina nos últimos anos ajuda a deteriorar, agora, as contas externas. O saldo comercial, de US$ 17 bilhões em 2009, caiu para US$ 11 bilhões em 2011 porque a alta das compras externas superou a das vendas. A renda dos anos de expansão beneficiou o consumo, em detrimento dos investimentos. A agenda populista dos governos Kirchner favoreceu essa tendência, seja nos pesados subsídios para energia e transporte, seja nas atitudes intempestivas que afugentam o capital de longo prazo. Os gargalos na infraestrutura estão evidentes e repercutem nas contas externas. De janeiro a junho deste ano, a Argentina importou do Brasil US$ 324 milhões de energia elétrica -alta de 98% em relação ao mesmo período de 2011. Com acesso restrito à finança internacional em razão do calote da década passada, o estrangulamento do saldo comercial coloca em xeque aquela que é, na prática, a única fonte de divisas do país. Essa ameaça compeliu uma mudança no eixo da política econômica da presidente Cristina Kirchner. A diretriz não declarada passou a ser evitar o colapso cambial. As reservas internacionais, em torno de US$ 45 bilhões, correspondem a oito meses de importações. Um nível perigoso -o Brasil, que ademais dispõe de amplo acesso a financiamento externo, possui reservas para 20 meses de importações. A quem não tem como tomar dinheiro no exterior, precisa evitar a secura de seu caixa em dólares e vê fechar-se a janela para aumentar exportações, só resta reprimir o consumo interno e as importações. O governo argentino não pode, por razões políticas, chamar sua política recessiva pelo nome. Mas é exatamente isso o que promove, deliberadamente, há alguns meses. A série de barreiras tarifárias ou burocráticas erguidas recentemente pelo país vizinho tem o propósito final de racionar dólares. Foram complementadas por outras ações cambiais para evitar a fuga de divisas, que fizeram disparar a cotação do peso no mercado paralelo. Suas consequências, como o desabastecimento pontual e a alta da inflação (já na casa dos 25%, segundo contas mais fidedignas), contribuem para frear o consumo interno e a atividade econômica. A economia se desacelera, em resposta quer a esses comandos políticos, quer ao constrangimento externo. O PIB, que subiu 8,9% no ano passado, aumentou 4% de janeiro a abril deste ano, na comparação com o mesmo período de 2011 -e a tendência desse indicador é de contínua deterioração. Enquanto as exportações argentinas permaneceram estagnadas nos primeiros cinco meses do ano, as importações inverteram rapidamente a tendência. Cresceram 30% em 2011; caíram 4% de janeiro a maio. O saldo externo voltou a subir, à custa dessa forte freada. Aqui entra o Brasil. Ao que consta, a presidente Dilma Rousseff apiedou-se da colega argentina e decidiu ceder renda comercial ao vizinho -aceitaria reduzir o superavit comercial com a Argentina, que no ano passado atingiu o recorde de US$ 5,8 bilhões. Não por coincidência, as exportações brasileiras para a Argentina caíram 15% no primeiro semestre de 2012. O saldo favorável ao Brasil, acumulado até junho, encolheu US$ 1 bilhão no cotejo com o mesmo período de 2011. Brasília tolerou muitas medidas protecionistas tomadas por Buenos Aires nos últimos meses. Pelo visto, está disposta a tolerar ainda mais. O argumento da emergência é, como de hábito, esgrimido neste momento. O Mercosul é responsável por 10% do comércio externo brasileiro, e o intercâmbio com a Argentina responde por mais de US$ 80 em cada US$ 100 negociados pelo Brasil no bloco regional. Mais de 90% das vendas brasileiras ao vizinho são de produtos manufaturados. Evitar a derrocada argentina seria, assim, de interesse estratégico para o Brasil. Só que, mais uma vez, o governo brasileiro se dispõe a empurrar o prejuízo para as empresas aqui instaladas. Elas serão novamente obrigadas a pagar a conta da ineficiência produtiva argentina, cultivada durante anos pelo descompromisso da Casa Rosada com as regras básicas do livre-comércio -sempre sob a complacência excessiva do Palácio do Planalto. Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros |
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