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Ruy Castro

Passageiro apitando

RIO DE JANEIRO - É um ritual quase semanal. No aeroporto, deposito jornal, livro, chaveiro do Flamengo, Tic Tac, moedas etc. naquela cestinha na esteira e, antes de passar pelo aparelho de raios X, aviso ao funcionário da Polícia Federal: "Tenho prótese, vou apitar". Passo pelo aparelho e não paga dez. Apito.

Já ciente de que o passageiro que acaba de apitar é um homem-bomba em potencial, o sujeito convoca um colega cuja função é revistar os "soi-disant" portadores de próteses. O fulano se aproxima, analisa o passageiro de alto a baixo e o convida a subir a um tapetinho junto à esteira, próprio para detectar metais perigosos, como revólveres, granadas ou próteses de cobalto cravadas no braço de algum terrorista, no caso, eu.

E, ali, exposto aos olhos dos passageiros inocentes que passaram pelo aparelho de raios X sem apitar, o apitador involuntário é ordenado a abrir os braços em cruz e as pernas, para levar uma geral como no tempo em que tinha 18 anos e andava de madrugada pelas ruas.

Por sorte, de algum tempo para cá os serviços de segurança dos aeroportos passaram a oferecer uma solução um pouquinho menos humilhante: o passageiro suspeito pode exigir ser revistado num cubículo reservado, ali perto. Assim, vamos todos para o cubículo: eu, o revistador e um segundo funcionário -este, certamente armado, para o caso de eu ser da Al Qaeda. E, pelos minutos seguintes, sou bolinado de frente e de costas, sob as axilas e entre as virilhas, por um marmanjo que faria melhor se estivesse na lavoura ou, de macacão, numa fábrica.

Esse ritual, a que venho me submetendo desde que ganhei uma prótese no ombro há seis meses, me irritava no começo. Hoje, só me provoca tédio. Em breve, espero já achar graça nele -e imaginar o que faz o revistador quando um passageiro lhe informa que sua prótese, bem menos inocente, é no pênis.

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