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Claudio Sales

Itaipu: imperialismo às avessas

É bravata dizer que o Acordo de Itaipu é ruim ao Paraguai. O país só ganha com ele: energia de graça e receitas milionárias, sem nenhum aporte de recurso

O novo presidente paraguaio, Federico Franco, declarou não estar disposto a vender o excedente de energia de Itaipu, dando a entender que a cede de graça ao Brasil.

Bravatas assim perpetuam a falsa noção de que o Tratado de Itaipu é desvantajoso ao Paraguai. A reação do governo brasileiro ao falatório foi de desdém. Não deveria ser. O governo deveria esclarecer a brasileiros e paraguaios sobre os fatos.

O Tratado de Itaipu foi a forma encontrada pelos países para viabilizar a divisão equânime da usina.

Como o Paraguai não teria demanda para consumir a sua metade da energia, o Brasil se comprometeu a adquirir toda a energia excedente. Assegurou-se assim o fluxo financeiro para Itaipu quitar os financiamentos que viabilizaram sua construção.

Tal arranjo vigora até 2023, quando se prevê a amortização dos investimentos na usina. Então, o Paraguai será detentor, sem qualquer ônus, de 50% da usina, cujo valor alguns estimam em US$ 60 bilhões.

O governo deveria explicar que a tarifa é definida pelo custo de cobrir os financiamentos e custos operacionais dividido pela "energia garantida", o que resulta, em 2011, numa tarifa de US$ 43,80/MWh.

A partir dessa estrutura básica, Itaipu dá benefícios adicionais ao Paraguai que são relevantes.

O primeiro decorre da "remuneração por cessão onerosa", que o Brasil paga ao Paraguai, no valor de US$ 8,40/MWh, que se soma ao custo da "energia garantida" vinculada à essa potência contratada (US$ 43,80/MWh). Somando esses dois componentes, verifica-se que o Paraguai vende ao Brasil a energia pelo valor de US$ 52,20/MWh.

A energia não é barata. Considerando o câmbio, o valor pago pelo Brasil pela energia proveniente do Paraguai já supera R$ 100,00/MWh, mais caro do que a energia de vários novos empreendimentos contratados em leilões de energia.

O segundo decorre de que, na maioria dos anos, a energia gerada pela usina é maior do que a "garantida", sendo que essa "energia adicional" é comercializada pelo seu custo operacional de US$ 5,70/MWh. Embora a "energia adicional" devesse ser repartida entre os dois países proporcionalmente à sua respectiva potência contratada, Itaipu tem priorizado sua disponibilização ao Paraguai.

Isso fez com que o custo médio da energia consumida pelo Paraguai em 2011 fosse de US$ 29,07/MWh, contra US$ 37,74/MWh pagos pelo Brasil (sem considerar a "remuneração por cessão de energia").

O Paraguai busca atrair indústrias eletrointensivas, mas não tem conseguido termos melhores do que a venda ao Brasil. A imprensa noticiou que há negociações com a Rio Tinto Alcan para a instalação de uma planta de alumínio. O preço pedido pela empresa seria ao redor de US$ 35/MWh, o que -como bem diz a vice-ministra de energia, Mercedes Canese- representaria um subsídio, pois é inferior aos US$ 52,20/MWh pagos pelo Brasil pela energia paraguaia que consome.

O Paraguai tem razão de buscar direcionar uma parcela maior da energia de Itaipu para o consumo interno. O país carece de suprimento, mas a falta de infraestrutura para escoar a energia é um entrave.

Até nisso, os seus vizinhos tem sido generosos. Através do Fundo de Convergência de Infraestrutura do Mercosul (Focem), Brasil (com 70%), Argentina e Uruguai estão financiando uma linha de transmissão de 500 kV para permitir o aproveitamento da energia de Itaipu.

O governo também deveria destacar que além de suprir 8.036 GWh de energia ao país, Itaipu proporcionou uma receita líquida aos paraguaios de US$ 319 milhões em 2011. E isso não é uma exceção; todos os anos têm sido assim.

O Paraguai só tem ganhado com Itaipu: energia de graça, receitas milionárias e sem envolver qualquer aporte de recurso. Parece um negócio da China. Mas não é. Trata-se de um negócio do Paraguai com o Brasil. Trata-se do Tratado de Itaipu.

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