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Declínio fabril

Embora contestada por alguns, a fragilização da indústria está em curso e precisa ser contida com aumento do investimento

O sofrível desempenho da indústria nos últimos quatro anos -a produção está no nível de meados de 2008- suscita um debate polarizado sobre o risco de desindustrialização do país.

No caso brasileiro, as correntes mais liberais que asseveram a ausência de desindustrialização mencionam, por exemplo, a relativa estabilidade da participação da indústria no PIB nos últimos dez anos e o crescimento do emprego no setor na última década.

Aqueles que acreditam numa desindustrialização em curso apontam o aumento do deficit comercial em setores de média e alta tecnologia, que atingiu US$ 92,5 bilhões em 2011.

A estagnação das exportações brasileiras como parcela do comércio mundial, em torno de 1% há décadas, seria forte indicação de que o país não consegue competir adequadamente no mercado global. Coreia e China, em comparação, lograram multiplicar sua participação no comércio mundial -e com incorporação de tecnologia superior à brasileira.

Esta Folha se inclina para a segunda tese, segundo a qual há evidências de um processo de fragilização da indústria nacional que, se não for detido, poderá em prazos mais longos prejudicar o desenvolvimento do país.

A preocupação com o setor não é um fetiche antiquado. Apesar de a economia contemporânea propiciar outras fontes de criação de valor -como é o caso dos serviços, cada vez mais globalizados-, a indústria permanece como foco da incorporação de tecnologia e do aumento da produtividade. Ela exerce, além disso, efeito multiplicador sobre outras áreas.

Verdade que, a partir de certo patamar de renda per capita, é natural que a indústria perca espaço para o setor de serviços. Nos Estados Unidos, por exemplo, a participação das manufaturas no PIB caiu para 13% em 2011, contra 21% em 1980.

Nos últimos anos, alguns países em desenvolvimento de renda per capita intermediária, como o próprio Brasil, parecem passar por algo similar. Há indicativos, entretanto, de que esse processo ocorre de forma prematura.

No caso brasileiro, é possível apontar a falta de coordenação entre gestão econômica de curto prazo (políticas monetária, fiscal e cambial) e ações de longo prazo (política industrial, pesquisa e inovação, incentivos gerais para o investimento) como uma barreira persistente ao crescimento da produtividade industrial.

Apenas há pouco tempo a necessidade de melhor alinhamento das medidas entrou no radar do governo federal. O sucesso recente na redução da taxa básica de juros é um ganho conjuntural importante. Do lado dos custos, o corte de até 28% nos preços de energia para a indústria anunciado pelo governo é um passo firme na direção correta. Mas ainda é pouco.

A tradicional baixa capacidade brasileira para exportar bens mais elaborados foi agravada nos últimos anos pelo aumento de custos internos e pelo câmbio valorizado, que advém em parte dos saldos obtidos nas exportações de matérias-primas a preços elevados.

É uma dinâmica oposta à dos países que usam o comércio internacional para aumentar a escala de produção e se aproximar da fronteira tecnológica.

Novamente os asiáticos saltam à vista ao ostentar cada vez mais empresas de classe mundial. Para tanto, além de uma gestão econômica que sustenta o pleno emprego interno com custos de produção contidos, tendem a manter a taxa de câmbio desvalorizada.

No Brasil, no entanto, tal equilíbrio cambial só é viável sem produzir inflação se for acompanhado de aumento na taxa de poupança interna, ainda muito baixa (em torno de 19% do PIB, quando o desejável seria em torno de 25%).

Sem recursos para investimento em infraestrutura e desenvolvimento tecnológico, a produtividade do país estaciona ou declina.

Alguns analistas apontam o aumento contínuo dos gastos públicos nas últimas duas décadas, derivado em especial das despesas sociais, como fonte da elevada carga tributária e um dos principais fatores da crônica tendência à baixa poupança e à valorização cambial.

Não será com protecionismo oportunista -como o aumento de tarifas de importação de bens industriais anunciado nesta semana- que será defendida a competitividade de produtos nacionais.

O país só conseguirá voltar a usar a alavanca da indústria para impulsionar o desenvolvimento se aderir sem reservas ao imperativo da inovação e conseguir sustentar uma taxa de câmbio mais desvalorizada.

Daqui para a frente, o foco deve ser deslanchar no país o investimento produtivo e a poupança doméstica, o que pressupõe reduzir o ritmo de alta das despesas do Estado.

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