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Biologia de longo alcance

O ano de 1962 não teve só a estreia de James Bond no cinema, da canção "Love me Do", dos Beatles, e da bíblia ambiental "Primavera Silenciosa", de Rachel Carson.

Exatos 50 anos atrás, conferia-se também o Prêmio Nobel em Medicina a Francis Crick, James Watson e Maurice Wilkins, pela descoberta da estrutura do DNA, que iniciou a revolução da biologia molecular.

Naquele mesmo ano, John B. Gurdon realizava o experimento que lhe daria o Nobel em Medicina de 2012. E, no Japão, nascia Shinya Yamanaka, o outro laureado.

Os feitos do britânico e do japonês marcam os extremos do avanço vertiginoso da biomedicina na segunda metade do século 20: da simples biologia celular à capacidade de ajustar a sintonia fina da célula para mudar seu destino.

Gurdon provou que era possível reprogramar uma célula especializada do corpo e fazê-la recuar ao próprio passado. Tomou um óvulo de rã, retirou-lhe o núcleo e substituiu-o com o de uma célula do intestino do animal adulto; o constructo, como se fosse um óvulo fecundado, desenvolveu-se num embrião e originou um girino sadio.

Em 1996, técnica similar permitiu gerar a ovelha Dolly, primeiro clone de mamífero -e bem mais célebre, pela aversão moral à clonagem de um animal mais evoluído.

Se Gurdon forneceu a prova de princípio da reprogramação celular, Yamanaka a levou às últimas consequências. Ativando os genes certos, conseguiu reverter células à sua condição mais fundamental, a de célula-tronco pluripotente.

Essas unidades guardam a capacidade de originar qualquer célula do corpo, o que as torna especialmente atraentes para desenvolver terapias regenerativas. Até o advento da técnica japonesa, porém, as células-tronco só podiam ser obtidas com a destruição de embriões, o que suscitava intermináveis controvérsias.

Com as chamadas células pluripotentes induzidas de Yamanaka, a limitação desapareceu. Foram, por isso, festejadas pelos inimigos das células-tronco embrionárias, cuja obtenção era equiparada ao aborto ("assassinato" de embriões, ainda que estivessem congelados em clínicas de fertilização).

O Nobel para Yamanaka, de certa forma, lhes dá razão. Mas a divisão do prêmio com Gurdon serve para assinalar que ambos os estudos integram um longo arco de intromissões da técnica no recesso do organismo, cujo potencial polêmico está longe de esgotar-se.

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