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ESPERANÇAS E TEMORES
Raras vezes um presidente da
República terá assumido suas
funções com o nível de expectativas,
numa ponta, e de temores, na outra,
tão elevado como faz hoje Luiz Inácio Lula da Silva.
Parte das esperanças depositadas
no novo mandatário decorre do fato
de o Brasil ter conseguido chegar a
uma democracia de fato de massas,
com uma participação eleitoral invejável. Basta lembrar que, no ano da
eleição de Jânio Quadros, em 1960, o
eleitorado representava apenas 22%
da população, ao passo que, em
2002, a proporção multiplicou-se
por três (65,71% exatamente).
A outra parte, no entanto, decorre
claramente da história de vida de Lula e de sua identificação com o imaginário da massa de eleitores em especial os mais pobres.
Na outra ponta, no entanto, há todos os temores decorrentes da fragilidade da situação financeira, agravados pelo fato de a inflação ter atingido patamares que pareciam desterrados para sempre.
Há, além disso, a evidência de que
as margens de manobra para governos de países em desenvolvimento se
estreitaram enormemente como
consequência inexorável do fenômeno da globalização.
O capital financeiro é hoje tão ágil
que uma palavra inconveniente ou
mal interpretada dita em Brasília estoura instantaneamente em Nova
York ou em Hong Kong, em Tóquio
ou em Frankfurt, e volta como um
bumerangue na forma de aumento
do dólar e do risco-país.
Explica-se, por isso, a extrema cautela das autoridades que assumem
hoje ao tratar de temas econômicos.
O discurso de Antonio Palocci, o novo ministro da Fazenda, caberia perfeitamente na boca de Pedro Malan.
O problema crucial para o novo governo será administrar, ao mesmo
tempo, temores e esperanças, sem
ceder demais aos mercados, sem
contrariar demais o eleitor, mas também sem aventurar-se em medidas
econômicas excessivamente heterodoxas ou em atendimento populista
às demandas da rua, por mais justas
que sejam -e de fato são.
O governo Lula, portanto, começa
hoje a caminhar no fio da navalha.
Tem direito à torcida para que dê certo, mas esta Folha se reserva o direito
de manter a vigilância sobre o novo
governo, como o fez em relação aos
que o antecederam, no que é a sua
melhor contribuição para que as esperanças, ao final, prevaleçam sobre
os temores.
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