São Paulo, quinta-feira, 01 de janeiro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Editoriais

editoriais@uol.com.br

A fôrma e as ideias

RESTRINGE-SE quase apenas à classe dos linguistas a expectativa pela estreia, hoje, de mais uma reforma ortográfica no Brasil. As mudanças por ora são ignoradas pela maioria da população brasileira e terão impacto reduzido no cotidiano: a cada mil palavras utilizadas, cinco serão alteradas.
Não se veem, no momento de sua implantação, o apreço e o zelo pelo Acordo entre as autoridades que o negociaram, aprovaram e instituíram. Nem o Congresso Nacional nem o governo federal se prepararam para cumprir o decreto assinado em 29 de setembro pelo presidente Lula.
Documentos oficiais deveriam adotar a nova convenção a partir de hoje -há um prazo de transição, até 2012, mas ele vale apenas para a área didática (livros e concursos públicos). Num desleixo exemplar, o governo não treinou funcionários para a nova ortografia e não faz ideia de quando vai implementá-la. Na Câmara e no Senado, o assunto nem sequer foi discutido.
Pensado para unificar a linguagem escrita nos países lusófonos, o Acordo Ortográfico produz muito barulho por quase nada. Seu impacto estará concentrado na burocracia diplomática -não será mais necessário "traduzir" documentos para as diversas grafias nacionais do idioma- e no mercado editorial, que vai movimentar-se nos próximos anos para adaptar livros e dicionários ao novo padrão.
A ortografia que está sendo substituída não constitui barreira para a compreensão de textos escritos no padrão de outro país. Dificuldades maiores são oferecidas pela construção das frases e pelo vocabulário mobilizado nas diversas regiões em que se fala o idioma.
Somente a experiência da leitura sistemática e a exposição constante a textos de tradições nacionais, regionais e históricas diversas podem levar à superação desses obstáculos. A nova ortografia altera algumas fôrmas das ideias, jamais seu conteúdo.
Com ou sem reforma, milhões de jovens brasileiros continuarão saindo da escola sem acesso a esse universo de conhecimento.


Texto Anterior: Editoriais: Desafios de 2009
Próximo Texto: São Paulo - Clóvis Rossi: Uma noite de paz em Gaza
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.