|
Próximo Texto | Índice
Editoriais
editoriais@uol.com.br
Processo desgastante
Julgamento do escândalo do mensalão corre o risco de se tornar palco de guerrilha jurídica sem desfecho em prazo visível
QUASE QUATRO anos depois das primeiras notícias em torno do caso, o julgamento dos
acusados no escândalo do mensalão está muito longe de um
desfecho.
Os 39 réus do processo arrolaram 600 testemunhas em seu favor; algumas delas residem em
outros países, e a mera tradução
dos volumosos autos do processo
em língua estrangeira teria um
custo de R$ 19 milhões, estima o
ministro Joaquim Barbosa, do
Supremo Tribunal Federal.
Relator do processo no tribunal, Barbosa confirmou recentemente que cabe à defesa arcar
com os gastos previstos nessa
tradução. Foi uma tentativa de
evitar que, ao menos em razão
deste ponto específico, o julgamento fosse protelado.
Ainda assim, persistem as razões para que tudo caminhe com
extrema lentidão. O Supremo
deliberou, no ano passado, que
os depoimentos das diversas testemunhas na Justiça não poderiam ocorrer simultaneamente
em diferentes Estados do país,
uma vez que a presença dos advogados de defesa deve estar assegurada em cada um dos interrogatórios. Calcula-se que só em
meados de 2010 estará encerrada essa etapa do processo.
As peculiaridades e dimensões
do caso fazem prever, sem dúvida, novas complicações e peripécias táticas na verdadeira guerrilha judicial que se desenvolve
entre as prioridades da Justiça e
os interesses dos acusados. Por
certo, num regime democrático
se assegura aos cidadãos o mais
amplo direito à defesa.
No julgamento do mensalão,
como em tantos outros casos envolvendo políticos acusados de
irregularidades e crimes do colarinho branco, prevalece entretanto a percepção de que se sacrifica, graças a todo tipo de recursos protelatórios, um aspecto
não menos importante do que a
da ampla defesa de um acusado:
consiste na expectativa de que a
Justiça seja igual para todos e de
que a sociedade possa de fato defender-se de seus agressores, não
importa o quão privilegiados
possam ser.
O Supremo Tribunal Federal
divulgou na sexta o número dos
casos envolvendo autoridades
que, em decorrência do mecanismo do foro privilegiado, estão
sob exame na corte. São 275 inquéritos e 103 ações penais.
Ainda que, em última análise, o
foro privilegiado venha a reduzir
as possibilidades de recursos
protelatórios -uma vez que o
julgamento se concentra numa
só instância judicial-, a sobrecarga de processos no STF não
deixa de ser, por si mesma, mais
um fator a dificultar o pronto
desfecho de cada julgamento.
O risco não é apenas de que
prescrevam as acusações que pesam sobre os réus, mas também
o de que, com o passar do tempo
e com o advento de novos escândalos, perca-se a memória daqueles, gravíssimos, que haviam
mobilizado a seu tempo as atenções da sociedade. E sobre esta
viria a cair, em tal hipótese, uma
inevitável condenação -a de ver
repetidos perpetuamente casos
em tudo semelhantes àqueles a
que não conseguiu dar justa e rápida resposta.
Próximo Texto: Editoriais: Concessão urbanística Índice
|