São Paulo, quinta-feira, 01 de maio de 2008

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Euforia e risco

Agência global melhora nota do Brasil, o que é bom, mas persistem as distorções em juros, tributos e dívida pública

O FRENESI que tomou conta do mercado financeiro e da retórica governista ontem foi desencadeado por três letras B, seguidas de um sinal de menos. Trata-se da nota com a qual a agência internacional Standard & Poor's elevou o Brasil ao chamado grau de investimento ("investment grade").
Em termos técnicos, a mudança significa que, aos olhos do escritório privado de classificação de risco, emprestar ao Tesouro Nacional, comprando papéis de longo prazo emitidos em moeda estrangeira, passou a ser opção relativamente segura; deixou de ser especulativa. O potencial de impacto da alteração, no entanto, é muito mais abrangente.
Uma série de instituições multibilionárias ao redor do mundo está proibida, por lei, de aplicar recursos em países que não detenham grau de investimento. A proibição inclui, por exemplo, grandes fundos de pensão sediados nos Estados Unidos e na Europa. O Brasil, a partir de agora, torna-se fronteira permitida para esse tipo de poupador.
No curto prazo, porém, as implicações positivas da decisão da Standard & Poor's, que provavelmente será imitada por outras agências globais, estarão condicionadas a dois fatores limitantes. O primeiro é a própria reputação dos principais classificadores de risco do planeta, severamente danificada pela crise das hipotecas nos EUA. O segundo, e mais importante, são as incertezas decorrentes dessa mesma crise, bem como dos temores de superaquecimento no conjunto das economias emergentes.
A propósito, ontem o Fed cortou 0,25 ponto percentual de sua taxa de juros de curto prazo, agora em 2% ao ano. Em comunicado ambíguo, o BC americano deu a entender que o ritmo de redução dos juros vai diminuir, ou até parar. Se isso significa que o risco de recessão na maior economia do planeta está caindo, como parece apontar o resultado do PIB no primeiro trimestre, será boa notícia para todos, ao menos num primeiro momento.
Apesar de ter atingido condição macroeconômica mais sólida -por conta de um misto de políticas corretas, que propiciaram previsibilidade ao ambiente dos negócios, e sorte-, o Brasil ainda ostenta indicadores muito problemáticos. Em relação a países em estágio parecido de desenvolvimento, tributa demais, pratica juros elevados e gasta uma exorbitância com a dívida pública.
O "investment grade" poderá facilitar a correção dessas distorções. Mas, sem reorientação da política econômica -que exigiria redução nos gastos públicos-, há o perigo de o Brasil tornar-se mais um exemplo de aposta furada das agências globais de risco.


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