São Paulo, domingo, 01 de junho de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TENDÊNCIAS/DEBATES

Os impostos e o princípio da solidariedade

PATRUS ANANIAS

É preciso estabelecer parâmetros para garantir uma arrecadação consistente e em bases justas e equilibradas

O BRASIL vive um momento histórico, tendo conseguido aliar várias dimensões de um amplo projeto de desenvolvimento integral e integrado: temos o controle da inflação, estamos alcançando bons índices de crescimento econômico, as obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) reforçam a infra-estrutura, as políticas sociais estão alcançando inegável êxito nacional de melhoria da qualidade de vida dos pobres e reconhecimento internacional.
Manter, consolidar e ampliar essas conquistas é um esforço que exige recursos -e, a respeito da fonte desses recursos (os impostos), precisamos de uma conversa franca. É preciso estabelecer parâmetros para garantir uma arrecadação consistente e em bases justas e equilibradas, que estimule e promova o crescimento.
Um sistema tributário justo e eficiente é pressuposto para promover justiça social. Foi essa a opção, entre outros, dos países escandinavos, que fixaram condições de ampliar a capacidade de investimento do Estados, com clara opção pela promoção do bem-estar social e articulação do desenvolvimento em bases inclusivas.
A fórmula adequada ao princípio da justiça tributária parece simples: quem pode mais paga mais, quem pode menos paga menos e quem não pode nada não paga nada; recebe agora para contribuir mais à frente. É o princípio da solidariedade, consagrado como um valor em nosso texto constitucional, no artigo 3º, inciso I, e materializado tributariamente no artigo 145, parágrafo 1º, por meio do instituto da capacidade contributiva.
Mas precisamos aperfeiçoar nosso sistema tributário, de modo a aproximá-lo mais desse modelo. As bases estão dadas, e sobre elas há consenso: trabalhamos pela garantia de estabilidade da economia, de preservação das condições de investimento para os empresários. Os limites, que em momento nenhum se confundem com limites à capacidade produtiva e de investimento, são dados pela contribuição efetiva para o bem comum.
O montante de nossa carga tributária (35,5%) está um pouco abaixo da média dos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), que é de 36,9%. Mas temos sérios problemas em sua composição e estrutura, o que reforça nossa necessidade de reformulação do sistema para estabelecer bases mais justas de taxação.
Coloca-se, nessa discussão, a questão de impostos sobre lucros, sobre propriedades urbanas e rurais não produtivas, sobre grandes fortunas. Faz sentido taxar mais o lucro, a propriedade e a renda e menos o consumo básico, o trabalho, a produção.
Na composição de nossa carga tributária, os impostos indiretos têm peso muito maior que os impostos diretos, o que traz um grave problema, porque os impostos indiretos -ISS, ICMS, IPI- promovem o repasse aos produtos, e os consumidores pagam indistintamente o mesmo imposto, independentemente da renda. Os impostos diretos, como o Imposto de Renda, como foi a CPMF, trazem o caráter progressivo, são mais justos, proporcionais à renda das pessoas.
Outra vantagem é a transparência: os impostos diretos são mais visivelmente fiscalizados, o contribuinte sabe exatamente quanto está pagando.
A característica que torna esses impostos mais impopulares é a mesma que confere ao sistema maior possibilidade de eficiência e eficácia, pois facilita não só a fiscalização por parte do Estado mas também por parte da sociedade, que é um outro valioso princípio de um sistema tributário justo. Além de saber exatamente quanto está pagando, o contribuinte tem o direito de saber como está sendo utilizado o recurso: para onde é destinado e que resultado tem.
Por isso a necessidade de continuar investindo na melhoria do acompanhamento das políticas, por meio de aperfeiçoamento de mecanismos de fiscalização e de produção de indicadores que permitam o monitoramento e a avaliação sistemática dos efeitos das políticas. O governo federal tem se empenhado muito nesse sentido, e precisamos avançar sempre mais.
Uma sociedade construída com base em um conceito de justiça tributária que produza justiça social rende benefício a todos, porque promove coesão social e gera vínculos de segurança, diminuindo a marginalidade e a violência. É um modelo que também estimula o dinamismo econômico, porque amplia o mercado interno. Assim, possibilitará uma vida mais rica e mais plena para todos.


PATRUS ANANIAS , 56, advogado, é o ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Foi prefeito de Belo Horizonte (1993-1996).

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br


Texto Anterior: Frases

Próximo Texto: João Grandino Rodas: Populismo jurídico não salvará a Amazônia

Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.