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FERNANDO DE BARROS E SILVA
O trapézio de Lula
SÃO PAULO - Como o emplastro anti-hipocondríaco que Brás Cubas carregava no trapézio que tinha no cérebro, Lula também pendurou na cabeça uma idéia fixa: o denuncismo da
imprensa faz mal à saúde do país.
No caso do defunto autor machadiano, a invenção que ele divulgava
com o propósito de "aliviar a dor da
nossa melancólica humanidade" era,
na verdade, movida pelo desejo de lucro e reconhecimento. Como ele próprio confessa do além: "De um lado,
filantropia e lucro, de outro lado, sede de nomeada. Digamos: -amor
da glória" . Estando do lado de cá,
entre os mortais -e no poder-, Lula não ousaria ser tão sincero.
Anteontem à noite, ao participar
de mais um convescote da mídia,
prestigiando uma revista que o apóia
abertamente, o presidente voltou a
martelar o suposto denuncismo da
imprensa, segundo ele um subproduto de interesses comerciais das empresas jornalísticas, que privilegiariam o escândalo à informação.
O argumento é cretino. Até os menos informados sabem que o jornalismo político é um produto em baixa no mercado. O leitor hoje quer saber e comprar outras coisas.
Isso, porém, é o de menos. A ofensiva do governo petista contra os "abusos da imprensa" não visa aprimorar
nossa democracia nem preservar
nossas instituições, mas justamente o
contrário. E isso os Brás Cubas do
Planalto precisam esconder em vida.
O escárnio da elite petista vai, no
entanto, além. Marcelo Coelho mostrou na semana passada, na Ilustrada, que o PT herda o discurso fernando-henriquista quando fala em "governabilidade" e condena o "denuncismo". Mais ainda: o PT reciclou e
aprimorou o casuísmo institucional.
Na democracia de resultados petista, é preciso enquadrar a imprensa e
amarrar o Ministério Público. É mesmo chato ler no jornal que o governo
federal agiu na surdina para beneficiar Marta no pagamento da dívida
da Prefeitura de São Paulo. Não é lá
muito confortável ver o Ministério
Público remexer na sujeira ainda
mal explicada do caso Santo André.
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