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FERNANDO GABEIRA
A história e suas curvas
O LONGO julgamento no STF
é um marco. De um lado, expressa o fim da tolerância
com um sistema político apodrecido; de outro, indica para a história
um traço decisivo do primeiro
mandato de Lula e seus aliados.
Não é a primeira vez que vejo um
fato histórico. Também não é a primeira vez que sinto um vazio no
peito olhando o céu azul, o movimento dos carros: tudo corre no
seu ritmo habitual, apesar dos esforços para mapear o tempo.
A compreensão de que o PT apenas radicalizou métodos e atraiu
personagens já conhecidos de períodos anteriores pode nos dar
uma idéia de um fim da história,
versão brasileira. Em outras palavras: se o PT e seus aliados fazem a
mesma coisa que outros fizeram,
isso quer dizer que estaremos permanentemente sujeitos à alternância de quadrilhas, mais ou menos sofisticadas, mais ou menos
discretas.
Se olharmos apenas para a dimensão da política profissional, as
esperanças são pequenas. Não é
possível confiar nos partidos, e o
digo com certa tristeza, pois ajudei
a criar um. No entanto, volto à minha tese habitual: o horizonte político petrificou-se, mas a sociedade
continua em movimento. É esse
movimento que dinamiza a apuração de escândalos, que empareda
figuras como Renan Calheiros e
encontrou eco no Supremo, como,
de certa forma, também o encontrou nas instituições que fiscalizam o desvio de verbas públicas e
outras modalidades de corrupção.
Os gatos pingados que resistem
no interior do sistema político convencional são importantes. No entanto, a grande contradição explodiu na sociedade. Se era assim tão
grande, como explicar que não tenha alterado o curso eleitoral?
A contradição entre a sociedade
e um sistema político apodrecido
teve importância, mas não foi decisiva. Os admiradores dizem que
Lula paira acima de tudo. Isso é
uma visão religiosa, que discutirei
quando tratar da política como revelação de fé.
No Rio, o ex-governador Garotinho venceu uma e, na segunda, elegeu sua mulher. A fórmula era a
mesma de Lula, embora sejam personagens com diferentes dimensões históricas. Garotinho dizia-se
perseguido pelas elites, argumentava que seu governo cuidava dos
pobres.
Essa formula tem um grande peso eleitoral. Mas não se eterniza. A
sociedade continuará se movendo,
e a grande incógnita é o surgimento
de coalizão de novo tipo, que possa
representar seus anseios. Como a
história não é roteiro predeterminado, só nos resta trabalhar com o
ânimo que a semana despertou.
assessoria@gabeira.com.br
FERNANDO GABEIRA escreve aos sábados nesta
coluna.
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