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ROBERTO MANGABEIRA UNGER
Outra globalização
A ASCENSÃO do Brasil, como
a de qualquer grande nação
portadora de mensagem para a humanidade, deve vir acompanhada de uma idéia de como se deve organizar o mundo. Não nos
obriguemos a escolher entre aceitar e combater aquilo que se convencionou chamar globalização.
Precisamos de uma globalização
diferente.
Tradicionalmente, nossa diplomacia se deixa vidrar em reivindicações específicas, como a superação do protecionismo agrícola. Livremo-nos desse pragmatismo anti-pragmático: os interesses dividem e afastam quando não defendidos no bojo de uma visão abrangente e magnânima.
Quatro teses definem a parte
dessa outra globalização que tem a
ver com a economia mundial.
A primeira tese é que o princípio
a nortear as relações econômicas
entre os países não deve ser a maximização do livre comércio. Deve
ser a reconciliação de estratégias
diferentes de desenvolvimento
dentro de uma economia mundial
que se vai abrindo progressivamente.
A segunda tese é não permitir
que a abertura econômica sirva de
pretexto para impor determinada
espécie da economia de mercado.
Por exemplo, o que se insiste em
proibir como subsídio pode ser
parte de esforço para criar novos tipos de mercados, acessíveis a mais
gente. A história mostra: sempre
que se quer tornar a economia de
mercado mais includente socialmente é preciso inovar nas instituições econômicas. Que as regras
do comércio internacional não
atrapalhem.
A terceira tese é rejeitar uma globalização que assegure plena liberdade de movimento para as coisas
e para o dinheiro e pouca liberdade
de movimento para as pessoas e
para as idéias. Esta liberdade há de
avançar, em passos seguidos, junto
com aquela.
A quarta tese é construir a economia mundial sobre a base do trabalho livre, não de um assalariado
que pouco difira da escravidão. A
aceitação por países em desenvolvimento de padrões de valorização
do trabalhador e de seus direitos
deve ter duas contrapartidas: o
maior acesso aos mercados dos
países ricos e a revisão de um regime de propriedade intelectual que
restringe o potencial produtivo das
inovações tecnológicas e científicas.
Com suas vastas dimensões, suas
democracias vibrantes, embora falhas, e seus anseios de libertação
social, o Brasil e a Índia são hoje os
países em melhores condições para
tomar a vanguarda dessa luta. Projeto interno forte e projeto externo
forte precisam um do outro. E ambos precisam de menos mediocridade e de mais imaginação.
www.robertounger.net
ROBERTO MANGABEIRA UNGER escreve às terças-feiras nesta coluna.
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