São Paulo, domingo, 02 de abril de 2006

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JOGO DE ESCONDE-ESCONDE

Nem bem o caseiro sai de cena e cabe agora a um modesto escrivão da Polícia Federal o papel de desmascarar mais um dos fragilíssimos expedientes a que se recorre, nas esferas governistas, sempre que o objetivo é fugir à verdade e à vigilância da opinião pública.
O episódio teve correrias e ridículos típicos de um teatro de vaudeville. Tratava-se de entregar ao presidente do Sebrae, o sempre esquivo Paulo Okamotto, uma convocação oficial para que comparecesse à CPI dos Bingos, onde se espera sua acareação com o ex-militante do PT Paulo de Tarso Venceslau. O escrivão José Bráulio Rodrigues -a quem, talvez, valeria recomendar que tomasse providências em defesa de seu sigilo bancário- bateu às portas do Sebrae; quiseram inicialmente impedi-lo de chegar ao gabinete do intimado. Depois, foi informado que Okamotto estava ausente, em viagem de trabalho a Minas Gerais.
Não era verdade. O escrivão teve de voltar ao gabinete para corrigir um erro protocolar na intimação; e surpreende ninguém menos que o célere Okamotto circulando pelo local. Conclui-se que a única coisa a aproximar Minas do presidente do Sebrae é que este também estava onde sempre esteve.
Se o esconde-esconde no Sebrae teve aspectos de comédia de bulevar, o caso de Antonio Palocci suscita comparações de corte mais clássico. Evite-se, entretanto, classificar como digna de Molière a cena de um ex-ministro submetendo-se a cuidados médicos no momento em que seria intimado pela Polícia Federal. Estaria com estresse e problemas de pressão. Dada a intensidade da crise que o abateu, não é essa a mais implausível de suas alegações.
Na obra do comediógrafo francês, o universo do "Malade Imaginaire" é bem distinto das santarrices de "Le Tartuffe"; aqui, o misto de carolice e de esparrela nos remete à última semana do governo Alckmin. Revelado pela Folha o uso político nas verbas de publicidade da Nossa Caixa, o assessor de comunicação do primeiro mandatário do Estado se viu forçado a pedir demissão. Um dia antes, confrontado com o escândalo, Alckmin o respaldara no cargo.
Um relance pelo ambiente da alta-costura completa o quadro. O estilista de Lu Alckmin revelou ter-lhe presenteado com 400 peças de vestuário. Muito menos, retruca a assessoria da ex-primeira-dama; e de todo modo foram encaminhadas a uma entidade filantrópica. Só que a instituição não confirma o recebimento das roupas.
Todos esses episódios têm em comum a força com que desafiam a credulidade da população; o subterfúgio, a desculpa e o pretexto tornam-se componentes constantes no cenário político brasileiro. Como na fábula, há sempre quem aponte que o rei está nu; das liminares do STF aos esclarecimentos "ad hoc" de algum assessor, para não falar dos atos de pura evasão física diante do assédio da imprensa ou da polícia, esconder-se, então -mas sem perder o cinismo jamais-, é tudo o que resta como tática de Estado.


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